Engraçado
e estranho como a vida ou o destino, se assim se prefere nomear as insondáveis
circunstâncias que entrelaçam caminhos a revelia de nossa vontade e desejos,
trabalham.
Mais
estranho ainda é como a empatia de uma situação pode transpor limites temporais
e nos dar uma olhadela num futuro possível com probabilidades e possibilidades
que, de nós quem pode saber ao certo, viriam a ser. Por outro lado, essas
mesmas situações podem nos dar um despertar, uma consciência do que é realmente
importante e de como, por razões diversas e tão individuais quanto nossas
personalidades, estamos diariamente a por fora tudo aquilo que realmente conta.
Se
há regra mais certa é que nos olhos alheios, poeira é refresco e eu mesmo,
vezes antes combativo nessas mesmas páginas que andavam abandonadas, acabei por
voltar à minha área de conforto e esquecer de que a pedra que atinge meu
vizinho, ainda que não direcionada a mim, faz ondas num lago tranqüilo (apenas
sob a superfície) as quais acabam por me alcançar não importa quão longe se
pareça estar do epicentro.
Há
alguns dias, conhecemos uma das partes envolvidas num desses infames ataques a
gueis. Creio que todos se recordem deles, lá pelo fim do ano passado, um casal
foi brutalmente agredido na região da Paulista e um deles foi seriamente
ferido, houve grande repercussão, entrevistas e todo aquele circo que não eles
mas a mídia adora armar apenas para ser suplantado pelo próximo assunto mais
escabroso e menos importante.
O
casal em si teve sua vida revirada, seu norte perdido tanto pessoal como
profissionalmente e pagaram o amargo preço da exposição e, com tamanha guinada,
irão dentro de poucos dias, embora do país em busca de ares mais frescos, novos
horizontes e oxalá um recomeço. De certa forma foi triste conhecer pessoa tão
especial e ter usufruído de sua companhia tão pouco tempo posto que nos pareceu
que, fossem outras as circunstâncias, ele e seu marido se tornariam parte de
nosso grupo de amados amigos.
Esse
gosto amargo do futuro já pretérito me incomoda porém, mais ainda me incomoda o
fato de ver duas pessoas que tinham uma vida em comum, planos, sonhos, desejos,
terem tudo isso arrancado de si não pela fatalidade que nos ronda feito cães de
Agosto mas pela violência ignorante que atinge todos nós pouco importa orientação
sexual, classe, etnia ou seja o que for; basta não ser igual, não estar de
acordo ou passar ao outro esse impressão e ainda pior, nem isso que ainda
poderia, num exercício forçado de lógica, estar aliado a crenças pessoais ou ‘ideológicas’
o que ainda não justificaria de forma alguma o fato mas, a gratuidade da coisa
me assusta, faz-se porque se quis, porque ‘deu vontade’ e porque se tem certeza
de que, via de regra, será o fato impune.
Esse
moço nos disse que muitos lhe torceram o nariz acusando-o de fuga mas, quem de
nós aqui longe do olho da tormenta, pode emitir tais julgamentos? Como saber se
não agiríamos da mesma forma? Não desejaríamos ir para outro lugar, recomeçar,
apagar tudo isso e tentar de novo? Não sei, poderia discorrer sobre um sem fim
de hipóteses fosse isso conosco aqui mas é praticamente impossível dizer ao
certo o que faríamos e utópico dizer a eles, com as peles ainda doídas do fato,
que essa ou aquela atitude é errada e que deveriam levantar, sacudir a poeira e
dar a volta por cima.
Triste,
abalou-me profundamente o fato e me fez pensar em como poucos graus nos separam
e como fazemos esses poucos graus virarem anos-luz, como é precioso o tempo que
temos uns com os outros seja pessoal ou virtualmente pois, sob todos os
aspectos, hoje cá estamos e amanhã podemos estar aqui ou ali ou mesmo nem
estar.
Entrei
nesse exílio aqui pela minha crença firme e já compartilhada de que isto não é
oficio mas diversão e, por assim ser, deve ser feito quando desejado mas, ao
mesmo tempo, esse contato com pessoas daqui e que mesmo distantes alimentavam,
creio eu, uma amizade clara fez e faz falta pois ainda que tenhamos momentos
ilha nenhum de nós, como já disse, nasceu para sê-la. Esse encontro com esse
amigo novo e que já se vai e por razões tão infames ainda que, como disse, não
lhe condene em absoluto, me fez colocar a mim e a meu amor em tal situação e
isso me apavorou e fez rogar a todos os santos que nunca e jamais ocorra seja
conosco ou com nossos amigos, talvez o impacto tenha sido de ver a desgraça que
existe e que pode bater à nossa porta do nada, a qualquer instante.
Não
posso prometer que mudarei nossa sociedade para que outros como eles nunca mais
passem por situações como essa e não tenham que deixar tudo aquilo que construíram
aqui para tentar reerguer suas vidas em outro lugar mas, talvez esteja mesmo na
hora de nós aqui desse vilarejo começarmos a unir as forças de alguma forma e
tentar, ao menos, fomentar alguma mudança ou acabaremos por ver cada vez mais
pessoas, todas são próximas, não há desconhecidos pois a violência/ignorância não
conhece amizade ou a falta dela, indo embora, perdendo sonhos ou pior, as
vidas.
Nesse
meio tempo, só posso desejar a eles toda a sorte do mundo, que encontrem uma
nova vida para onde vão e que ela seja infinitamente melhor que a já
conquistada por aqui. Que sejam felizes, que construam seus sonhos e alimentem
novos, que tenham dias maravilhosos, amor e perseverança para quando dos dias
mais nublados, que possam achar tudo aquilo que perderam aqui e que, se um dia
voltarem, encontrem não apenas os amigos deixados aqui, sedentos de seu abraço
e de revê-los mas, acima de tudo, possam encontrar um lugar onde viver suas
vidas em paz, com amor, respeito, justiça e tranquilidade, sem medo.
May the road rise with you!
sim, precisamos mesmo nos mobilizar, se não fizermos algo, logo todos nós tb seremos obrigados ao exílio.
ResponderExcluirFoxx, eu acho isso mesmo, antes que chegue a nossa porta ou das pessoas que amamos..
ExcluirHá momentos em que me sinto exilado nesta vida, neste planeta, nesta cidade ...
ResponderExcluirbom tê-lo de volta queridão ...
bjux
Gracias, Bratz! É como me sinto também...
ExcluirNão sei se ir embora é a solução, mas como diz a música "cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é". E preconceito existe aqui, alí e acolá! Homofobia existe em qualquer parte do mundo, mesmo nos mais abertos. Então, sem prejulgar decisões e oxalá que esteja errado, mas acrescentarão apenas outro preconceito a ser combatido na bagagem! o de "Imigrantes". Sorte aos seus amigos!
ResponderExcluirTambém não sei, meu amigo..mas, não sei caso no lugar deles se não tomaria decisão igual desejando deixar pra trás tudo de ruim que ocorreu..
ExcluirDe certa forma, também acho ideal ficar e tentar arrumar, de alguma forma dar o troco mas, de novo, fácil dizer quando são hipóteses....
Certíssimo Melo! Felizmente a vida [no caso os ANOS] me proporcionaram a capacidade de tomar atitudes mais radicais ... não estou mais para apanhar calado. Bateu ... Apanha!
ExcluirEu não ouso julgar a atitude deste ou aquele como covarde ou não. Cada um sabe da sua dor e das suas resoluções. Da mesma forma, cada um luta contra essa boçalidade atentada contra nós de uma forma. Há quem acredite que as mudanças tem que se dar do macro para o micro. Eu já acredito que as coisas mudam do micro pro macro, e um a um podemos mudar bastante esse panorama que vemos aí. Mas infelizmente leva tempo.
ResponderExcluirUm beijo Melo!
sim, leva tempo mas, às vezes acho que podemos dar uma acelerada nas coisas e infelizmente em nosso país as pessoas parecem pouco interessadas em fazer as coisas serem um pouco mais rápidas quanto o assunto é termos lei mais eficazes e eficientes...
ExcluirComo disse Régis, homofobia se encontra em qualquer lugar, e acredito quer do lado de lá deve ser ainda pior, pois vc não estará entre os seus para lhe confortar. Mas tb acredito o trauma que deve ser para com esses. Que eles fiquem bem.
ResponderExcluirbabe, também acho mas o que mais pesa é saber que poderia ter sido com qualquer um de nós..
Excluirenquanto estava na TV, era só mais um Datena da vida, ao vivo e em cores a coisa muda e dá medo mesmo...
acho também que o trauma deve ter sido enorme e essa partida foi a maneira que acharam para lidar com ele, quem de nós pode julgar..
Não é nada digno o que vou dizer mas comigo é: bateu, levou. E não "fisicamente" falando apenas. Sei que me entendes.
ResponderExcluirE onde tu andavas? Que sumiço todo foi este? Estás de volta e agora pra ficar????? Hahahahaha! Beijos, querido!
penso assim também mas, amore, como dizer o que faríamos sem ter estado na pele deles? enfim, que seja para melhor ao menos para eles, né?
Excluiran(dava) por aí, tirei umas férias, sempre disse que isso aqui é playground e não escritório mas, há que se dizer que faz uma falta enorme esse contato com vocês ainda mais sabendo ser o tempo de todos nós coisa preciosa e que deve ser gasta com quem queremos bem antes de qualquer outra cousa..
voltei, se é pra ficar, vamos vendo...