8 de dez. de 2021
judas
Precisamos revisar o conceito de traição e tirar dele o peso moral, religioso e construído pela sociedade e urgente!
O que é uma traição?
A grosso modo, sendo bem genérico e amplo, melhor, usando o léxico:
quebra da fidelidade prometida e empenhada por meio de ato pérfido; aleivosia, deslealdade, perfídia; ou seja, algo muito ruim e passível de reprimenda ou, conforme o caso, até consequências jurídicas e legais.
Desde que Judas vendeu o Messias por 30 moedas e até mesmo antes disso, o conceito de traição existe com apenas um intuito: construir, limitar e ajudar a manter o tecido social assim como as pessoas sob controle e dentro de um regime de conduta ético e que ajude a preservar a estrutura social como um todo.
A traição enquanto conceito moral é válida e realmente ajuda a manter a sociedade coesa, sem isso viveríamos na selvageria se bem que muitas vezes penso se já vivemos mas, vamos dar o benefício da dúvida. É o conceito de lealdade que nos mantém unidos, que nos une em grupos, amizades, família e outros construtos sociais pois precisamos da segurança deles para sentirmos que pertencemos a um lugar e que teremos sempre - ou quase - quem nos ajudará e com quem poderemos contar nos momentos mais tensos.
Quando essa confiança se quebra, temos a traição e ela machuca pois a confiança é algo que demora para ser construída e se quebra com uma facilidade extrema. Somos criaturas carentes por excelência e precisamos confiar no outro para termos algum tipo de plenitude, completude e pertencimento e isso não é ruim mas, deveríamos antes sermos fiéis a nós mesmos e não deixar nas mãos dos outros, é muita responsabilidade para qualquer ser humano que tem em seu DNA o gene da imperfeição e traição.
A romantização da traição enquanto componente dos relacionamentos afetivos é responsável por sermos as criaturas neuróticas, paranoicas e controladoras que somos, a construção moral e social que se fez em torno dos afetos, amores e sexo colocou o que deveria ser natural como nocivo, pecaminoso e crime e a traição passou a ser hedionda pois fere uma construção feita para condenar e aprisionar a todos sob um peso imenso que nenhum de nós é capaz de carregar.
Somos sim responsáveis pelo afeto que conquistamos como disse aquele autor mas, não somos e não podemos ser responsáveis pelo peso imenso de dedicar nossas vidas e essências, isso é uma traição da pior espécie, a traição a nós mesmos e a nossa natureza enquanto humanos. Enquanto não desmistificarmos a traição e a tratarmos dentro dos limites que ele possui, estaremos fadados a sermos infelizes e miseráveis e a fazer os outros tão infelizes e miseráveis quanto nós.
Veja bem, volto a dizer que ao nos envolvermos com outras pessoas nos tornamos sim responsáveis por elas e elas por nós mas apenas dentro do limite do que nós, enquanto dentro do relacionamento, desejamos construir juntos. Nesse contexto, a traição engloba macular o que desejamos enquanto juntos, o não respeitar a vontade do outro e sua essência, impor padrões e tentar mudar que somos para agradar uns aos outros, isso sim é traição ou então, fazer oi desejar o mal ao outro, agir de forma a prejudicar física ou emocionalmente, tratar com desdém e pouco valor os sentimentos, isso é traição.
O conceito 'romântico' da traição carnal e emocional precisa ser banido ou então colocado sob observação para que possamos todos ter mais serenidade e liberdade de expressar sexual e emocionalmente tudo que somos, não somos nem fomos feitos para limitações, elas foram criadas para manter a todos sob controle e em ordem, questionar isso é questionar a própria sociedade e isso nunca é fácil ou aceito, somos taxados de pervertidos, não amamos de verdade, não sentimos nada, quem ama não trai e por aí vai.
São esses conceitos que precisam ser revistos e rearranjados para que possamos ter autonomia sobre nossos corpos e sentimentos, apenas nós somos responsáveis por eles, colocar sob responsabilidade do outro tais coisas é receita certa para o desastre e infelicidade eterna e esse é pior tipo de traição.
7 de dez. de 2021
herdeiros do vírus
Ontem, após longo e tenebroso inverno, revi amigos.
Não serei hipócrita, já estava saindo com alguma regularidade mas evitando grandes aglomerações e espaços fechados na medida do possível mas, estava sim saindo já porém, depois de quase dois anos, rever pessoas que eu não tinha mais visto foi algo mágico.
Um sentimento de sobrevivência que já vinha embrionando e agora se faz mais real, somos sobreviventes e quando tudo isso for estudado, se estivermos aqui ainda, poderemos testemunhar esse período que passamos e dizer que estávamos lá.
Sei que ainda não passou por completo mas, nós que ainda estamos aqui temos um certo tipo de obrigação moral em contar a história e fazer com que não seja esquecida e que não tenhamos mais governos negacionistas quando a próxima pandemia vier - e ela virá, infelizmente - somos herdeiros do vírus.
Ele levou não apenas vidas mas nossos abraços e beijos, nossos encontros e contato, nossa vida comum tornou-se algo complexo e cheio de rituais que precisamos executar antes de podermos fazer as coisas mas, como bons humanos que somos, nos adaptamos.
Voltar a ver com olhos e não fotos e câmeras quem amamos, abraçar, tocar e sentir que estamos vivos não tem preço, tomara que passemos a dar mais valor a essas coisas agora que passamos por tudo isso, que possamos colocar, na medida do possível, nossas diferenças de lado e entender de uma vez por todas que a vida é um sopro, um segundo, um nada, um cristal delicado que pode quebrar do nada.
Nunca pensei que teria esse sentimento de sobrevivência ainda que, em alguns momentos de minha vida sim mas, por razões individuais, nunca em escala tão grande.
Vamos então aproveitar a herança do vírus e fazer valer esse momentos que teremos pela frente.
6 de dez. de 2021
the sound of music
2 de dez. de 2021
deus está morto(?)
Havia tido um pesadelo horrendo. Ainda incerto de estar realmente acordado ou ainda preso naquele horror onírico, chamou pelos outros Deuses para lhes contar o que sonhara e pedir que lhe interpretassem, dessem algum sentido, ordem ou significado pois mesmo sendo Deus, quando nos domínios do sonho ainda se submetia aos desígnios de divindades muito mais antigas, anteriores e há tempos esquecidas e mortas salvo na mente dos Deuses novos que ficaram em seu lugar sem saber se eram filhos desses Deuses de antes ou Novos Deuses que criaram a tudo que existia.
Cercado já dos outros Deuses, começou a contar-lhes seu pavoroso pesadelo mas antes, perguntou por quanto tempo havia dormido. Os Deuses não sabiam responder ao certo, alguns diziam apenas dias, outros horas, uns diziam que talvez milênios ou milhões de anos mas o consenso era que não se podia dizer já que o tempo para Deuses fluía de forma distinta.
Conformado com tal ignorância, o Deus começou seu relato.
Não se lembrava de como tinha adormecido mas apenas de, sem razão aparente, ter sentido um sono incontrolável e dormido quase que instantaneamente. Deuses dormem ainda que seja um fato muito raro e que deva ocorrer, para colocar em termos humanos, como se uma pessoa dormisse durante todo o decorrer de sua vida apenas duas vezes antes do sono permanente que nem mesmo Deuses podem escapar ainda que para eles, tal sono seja outra coisa.
O Deus lembrou-se de que de início não havia notado nada anormal, Deuses sonham mas são cuidadosos ao sonhar pois às vezes, de seus sonhos podem surgir realidades inesperadas e incontroláveis. Disse que primeiro apenas sonhara, nada fora do comum, sonhos de Deuses são de certa forma parecidos com o humanos, mudam apenas em escala.
Lembrou-se de que tudo parecia correr bem enquanto sonhava até, em certo momento, passou do sonho ao pesadelo onde pessoas eram criadas a sua imagem e habitavam um lugar idílico onde tudo era permitido e concedido e a inocência reinava lado a lado com o conhecimento mas, a criação divina parece não ter ficado satisfeita com aquilo e queria algo chamado liberdade e acabou se rebelando e o Deus, ressentido, expulsou a todos do lugar concedendo a liberdade que almejavam mas advertindo que ela não viria sem um preço.
Dali em diante o pesadelo foi piorando pois as criaturas e o Deus nunca mais se entenderam e pensavam sempre novas formas de ofender um ao outro acarretando guerras, desgraças, fome, doenças, morte, extinções, horrores jamais imaginados e tudo só fazia piorar ainda que, de tempos em tempos, houvesse algum período de distensão como um tipo de fôlego que se toma antes de mergulhar novamente a cabeça na água.
O Deus lembrava-se de que mesmo tendo feito de tudo para ajudar as criaturas, sua relação com elas seguia deteriorando e cada vez mais tanto ele como elas estavam descontentes e sem encontrar uma solução para a relação já desgastada. Havia gente qua ainda tentava fazer com que as duas partes se falassem mas eram arremedos de profetas e enviados e só faziam mais mal do que bem até que, depois de uma doença que dizimou quase todas as criaturas e que não fora do feitio do Deus porque ele, apesar de tudo, amava as criaturas e apenas enviava castigos proporcionais a ofensa que um filho comete a um pai eternamente amoroso; o Deus resolveu que era tempo de encerrar aquele experimento falido e num estalar de dedos dizimou todas as criaturas e foi nesse momento em que acordou.
O Deus terminou seu relato e pediu aos outros Deuses que lhe interpretassem o sonho. Sem saber o que dizer, os Deuses ficaram olhando uns para os outros buscando algum tipo de informação que permitisse responder ao questionamento feito mas sem encontrar.
O Deus ficou impaciente ante a mudez dos Deuses e exigia que lhes dessem uma explicação para aquele sonho inquietante até que, entre os Deuses, um se levantou e aproximando-se do Deus pousou a mão esquerda em seu ombro e disse.
Mas Deus está morto! Nós não somos Deuses mas seus companheiros neste sanatório há anos já! Você morreu faz tempo e nós também morremos há tantos anos que nem mais sabemos contar mas seguimos vivos e sonhando que somos Deuses e que você é Deus porque estamos vivos nas mentes de quem ainda lembra de nós mas, fomos trancafiados aqui porque não somos mais do que lembranças mesmo e ninguém lá fora quer viver delas salvo esses poucos que nos mantém vivos. Nós morremos juntos faz muito já, apenas não fomos enterrados mas trancados vivos aqui para irmos aos poucos definhando até deixarmos de ser...
Deus, estamos aqui então? Vamos morrer assim?
Todos acenaram com a cabeça e o Deus então deitou-se, encostou a cabeça no travesseiro e voltou a dormir.
1 de dez. de 2021
pequenas lembranças aleatórias
lembranças aleatórias não relacionadas com a infância
Lembrança #10 Lembro de uma festa ou rave ou balada que eu ajudei um amigo a organizar num tipo de sítio eu acho. Estava separado do meu nam...
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eu não, eu não e você eu sim, eu sim. essa dicotomia foi se arrastando pra dentro de nós com o tempo, matando aos poucos, pressionando se...
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seis horas, ave maria, rosário na mão para entrar no vagão cheio. vai com a turba, vai fundo, não tem volta, apenas vai. seis horas, ave...