12 de mai. de 2022

discurso pronto para um dia incerto

Dialogar com fascista é jogar xadrez com pombos, sabemos, mas nesse tabuleiro, as peças estão desiguais e tem vontade própria e as regras mudam a todo instante.

Um dos grandes fatores que nos fez a raça dominante nesse pálido ponto azul é fato de termos aprendido a trabalhar em grupo e é exatamente o que estamos perdendo/desaprendendo. Com o distanciamento promovido pela polarização e incapacidade de diálogo, estamos cada vez mais fechados em nós mesmo ou em grupos que apenas ecoam o que pensamos.

Esse fechamento, ainda que benéfico para manter a saúde física e mental, mata aos poucos o que nos faz únicos, a troca de ideias e pensamentos, ao nos colocarmos em opostos irreconciliáveis afastamos essa dinâmica e sequer cogitamos a possibilidade de discutir qualquer coisa que vá mesmo que de leve na direção contrária do que pensamos.

E isso ocorre de forma geral, não é 'privilégio' da esquerda, direita ou seja lá o que for. Obviamente que não podemos corroborar ou tentar dialogar com discursos ou ideias que promovam o ódio ou preconceito mas, tanto a cultura do conservadorismo com suas regras de exceção como a cultura do cancelamento, válida em alguns casos, acabam trazendo efeitos colaterais terríveis.

Julgamos sem conhecer o todo dos fatos, tendo apenas um lado da história, condenamos sem dar o benefício da dúvida, a internet e réu, advogado, juiz e júri e invariavelmente imperdoável, não cabe recurso e jamais esquece.

Condenamos as fake news mas somos os primeiros a repassar sem antes verificar, validar e termos certeza, o dedo like é mais rápido que a mente lerda, o mundo digital evoluiu mais rápido que nossos cérebros que ainda são analógicos e assim, vamos cancelando uns aos outros sem dó ou piedade.

Apontar desigualdades, crimes e preconceitos é um dever nosso e as redes tornam isso mais fácil e com alcance imediato, se antes tais horrores ficavam restritos a esfera pessoal ou de um grupo pequeno, agora viraliza e ganha o mundo em segundos e, como disse, isso é perigoso, perdemos o senso ético, o racional, a razão e a lógica impulsionados pelo desejo de sermos os primeiros a compartilhar, denunciar e fazer parte da patrulha alerta que está sempre de celular em mãos.

Repito que isso é sim benéfico pois abusos e violências não passam mais despercebidos mas, se não dermos um passo atrás e pensarmos cautelosamente antes de sair compartilhando tudo, estamos incorrendo num erro grotesco que rouba de nós o que nos faz humanos, tira nossa empatia e apenas fomenta o pior de nós e nunca está satisfeito, quer sempre mais e mais.

Antes de cancelarmos uns aos outros, expormos uns aos outros, condenarmos uns aos outros deveríamos tentar entender o contexto, a situação, os motivos, os sentimentos e volto a dizer que isso não abona ou justifica os comportamentos abjetos de racistas e afins mas, tomando a parte pelo todo acabamos colocando tudo no mesmo balaio e depois é bem complicado saber quem é o que.

Parece besteira não? Mas lembremos do caso da Escola Base em 1994 (Google it!). Os donos foram acusados de molestar as crianças, promoverem orgias e até mesmo entregarem as crianças para sexo com outras pessoas.

A mídia fez uma cobertura totalmente parcial agindo como juiz e júri e condenando de antemão os proprietários e a polícia fez uma investigação pouco elogiosa e totalmente tendenciosa porque eram crianças. O caso tomou proporções nacionais e o clamor por justiça falou mais alto do que o bom senso, os proprietários foram presos, perderam tudo e suas vidas viraram um inferno.

Três meses depois todos foram inocentados mas o estrago já estava feito. Dos proprietários, alguns já faleceram sem terem retomado sua vida e com a marca de abusadores, os sobreviventes seguem com suas vidas destruídas e tentando mesmo depois de tantos anos, buscar algum tipo de compensação ou justiça porque ainda seguem marcados mesmo inocentes.

Pense então muito bem antes de fazer seu próximo cancelamento...

Nenhum comentário:

Postar um comentário

one is the loniest number...

lembranças aleatórias não relacionadas com a infância

Lembrança #10 Lembro de uma festa ou rave ou balada que eu ajudei um amigo a organizar num tipo de sítio eu acho. Estava separado do meu nam...