29 de jul. de 2021

querência

olhei pela fresta, um fio de porta que deixava apenas uma parte do quarto na vista mas a parte que importava, a que me cabia, a que sempre usava quando ele chegava da rua com algum macho avulso, ele não era de macho fixo, só avulsos, dizia que de fixo já basta a vida, o resto tinha de ser avulso para não durar.

dizia que a porta tinha defeito, empenada, não fechava direito, só no tranco e depois para abrir era ruim demais então sempre deixava daquele jeito, meio aberta, meio fechada, fresta, um vão que saía dele para entrar em mim e eu via os machos e ele no quarto cavalgando feito cavalos no cio e aquela fresta me fazia feliz, eu guardava o gozo para ir junto com o deles e ele uma vez disse que teria de pintar a porta porque estava toda manchada, minhas manchas deixadas ali como evidência de um sexo que só fiz por um fio de porta, ri de nervoso, ele riu de sarro mesmo e piscou um olho como se fosse me dar algo em troca, algo que nunca veio.

aguardava ele chegar com os machos da rua, sabia até o peso de seus passos na escada, o ranger nos assoalho de madeira antiga carcomida por cupins e sexo, ele sabia, eu sabia, nós sabíamos e ele não fazia questão de fechar a porta quebrada, na verdade não estava, consegui fechar sem esforço e abrir da mesma forma uma vez, não era defeito, era safadeza mesmo, ele gostava que eu visse os machos que ele trazia para o quarto, queria que fosse os machos, queria que eu gozasse com os machos mas não sei porque nunca me fez isso.

uma vez eu perguntei.

ele disse que os machos eram avulsos e que eu seria fixo e ele não gostava de nada fixo, preferia que eu ficasse ali olhando, que fosse dele pelos machos e pela fresta, não queria que sua cama me conhecesse, queria apenas me sonhar e eu fiquei assim meio sem saber e evitei por dias presenciar os machos me sentindo mal por não ser eu ali, não ser o fixo, o avulso, não me importaria de ser avulso desde que fosse dele.

mas depois de uns dias, a vontade foi maior. fiquei esperando mas nada, só então me atentei de que não ouvia os passos na escada e no assoalho fazia um tempo, mergulhado que estava na minha infelicidade avulsa, nada dele nem dos machos que trazia, nada por dias seguidos, cansei de esperar e doido pelo desejo e medo de não ter mais a ele e seus machos, sai perguntando e soube que ele não mais vivia ali, ido, vazado, sumido, ninguém sabia como, onde ou porque, deixara o quarto vazio e a porta sem fechar, como a esperar que fosse lá ver seu sexo.

fui até o quarto, a porta lá nem aberta nem fechada, deve ser ruim para um porta ficar assim, porta foi feita para ficar aberta ou fechada, não no meio do caminho. olhei dentro e nada, empurrei a porta com cuidado e medo mas nada, o quarto seguia vazio, a cama no meio desfeita com lençóis tortos feito um instrumento de tortura, guimbas de cigarro pelo chão, um cheiro azedo vindo de não sei onde, um suor pesado exalando das paredes, sexo de todos os machos que haviam gozado ali, cheiro de todos os machos que haviam se largado ali, de todos os machos que haviam sido avulsos ali.

sentei na cama e toquei os lençóis sujos, não dava para sentir o tecido, haviam camadas e camadas de pele e sexo em cima, a cama era um depósito de vidas, um banco de sementes jogadas fora, um mar de pelos despregados de corpos tesos, um canavial de sexo e ali eu deitei e enfiei o nariz nas camadas de vidas e me enrolei nos panos com cheiro de sêmen e uso e gozei ali mesmo envolto num ar de machos de antes e machos que nunca vieram ou ficaram por pouco tempo, avulsos, nunca fixos.

levantei mole, melado, pernas bambas, sexo mole e pingando e fui até a porta que estava aberta, ao tentar fechar ela emperrou...

28 de jul. de 2021

menino luxento

 


Imagine o seguinte: você está jogando, qualquer jogo que seja, com amigos e está meio que perdendo ou indo muito mal e é um péssimo perdedor, o que você faz?

Você pode trapacear, certo? Tentar dar uma enrolada ou enganada, contar com a distração alheia e conseguir pular algumas casas ou fazer algum lance ou movimento ilegal, pode ser que funcione, pode ser que não, pode ser que alguém pegue você no pulo, fica chato mas você sempre pode dar uma desculpa e tentar se esquivar.

Pode culpar o jogo e suas regras, dizer que elas não são claras ou legítimas, que não ajudam você a ganhar o jogo, que foram feitas para favorecer fraudes e tal, que não concorda com elas e que deveriam ser alteradas porque estão te prejudicando mas, todos sempre jogaram por essas mesmas regras e nunca reclamaram, só você mesmo.

Pode falar que se for para jogar assim não vai mais jogar porque não acha justo, que as regras estão contra você, que os jogadores só se aproveitam delas para te ferrar, que tudo é injusto e perseguição, que não tem como jogar assim porque não está em pé de igualdade com os outros jogadores, que tudo é meio falso e fraudulento, que você não confia no jogo ainda que venha jogando ele faz um bom tempo já.

Pode desmanchar o tabuleiro, quebrar a peças, rasgar as regras, mandar os jogadores a merda e fazer um novo jogo que seja mais do seu jeito, com suas regras e quem não gostar, paciência.

2022 logo aí, vamos ver qual vai ser a estratégia do pombo enxadrista...

27 de jul. de 2021

vamos ser viado pra sempre

 


Em plena ditadura velada, tempo de mito, tempo de milícia, de negações, de messias falso, de família tradicional que estupra mas não mata e acaba matando, de não te estupro porque não merece, de arte censurada, de pensamento tolhido e vigiado, vamos ser viado pra sempre.

E em cadeia nacional, em evento internacional, na cara da sociedade, samba, dança, vai até o chão, desfila porque pode e desfila porque quer, deixa o povo do golpe passado e com ódio e deixa eles xingarem porque na cortada você deixa o queixo deles partido, o queixo e a mente deles são de vidro, cheios de pó de tanto que ficaram sem usar, mortos pelo capitão e seus filhos que só entendem o que é gado, pasto e Brasil verde de ódio e amarelo de medo.

Sim, sejamos todos viados pra sempre e cada vez mais viados, fico pensando na cara do mito e do seu pessoal vendo você bela, phynna, afrontosa nem aí para os olhares que te cravam, para os que intimamente querem sua morte, que odeiam estar com uma bixa representando o país, que preferiam ver você longe ou morta, bixa morta é bixa boa, será que terão coragem de te receber na volta? Capaz! Afinal, pelo andar da carruagem, eles terão pedir arrego para as bixas porque não vai sobrar mais ninguém para estender a mão e a gente, do alto de nossa bixice vai dizer na egípcia NÃO!

Então vamos ser viados pra sempre, porque sendo bixas, você sendo bixa está sendo bixa por todos nós, por todas as bixas que não podem ser bixa porque se o fizerem, morrem. Por todas baixas que por serem bixas morrem, morreram e morrerão. Por todas as bixas que não podem ser porque ser é um crime quando o Estado assim o diz. Por todas as bixas que somos porque precisamos ser bixas para fazermos sentido, não saberíamos ser de outra forma porque ser bixa é ser algo mais, o ser hétero é tão limitado e limítrofe, tão pouco, tão menos, tão sem graça, ser bixa é ser vida, é estar vida, é estar aqui e dar vida para tanta morte.

Então vai lá, seja bixa e leva nossa bixice ao limite, opa, não, esquece, bixa não tem limite, leva a gente para qualquer outro lugar que vai além então....



26 de jul. de 2021

devorem os ricos

 



A luta não é de classes mas de sobrevida, o fato que se estende há séculos desde que o mundo percebeu que a exploração é a única via de vida possível e palpável é de quem preciso menos sempre quer mais e precisa mais sempre consegue menos.

Não deveria ser surpresa então, certo? Afinal como o rico vai manter sua riqueza se tiver de bancar a subsistência dos mais pobres? A pobreza e a miséria não fazem parte do vocabulário social da elite porque para eles são apenas palavras, usadas vez ou outra para ilustrar uma ideia e percepção que deixam vazar oportunamente para não parecerem ser os insensíveis e isolados que são, se há pobreza e fome, então o Estado deve resolver isso porque não é culpa do rico e sim da sociedade, o rico não faz parte dela, vive em outro patamar onde tais conceitos e juízos são vagos e nebulosos.

Mas, não são apenas eles, somos todos nós que não estamos no um por cento e ainda assim achamos que fazemos parte dele. Em nosso dia a dia de caras viradas para o morador de rua, para o humano que vive em farrapos, anda descalço, a personificação de miséria humana para a qual pedimos a deus que ajude e cuide porque nós mesmos não temos tempo nem condições de fazer então, qual a diferença entre o rico e nós além do dinheiro?

O dinheiro permite ao rico colocar barreiras entre ele e tudo isso enquanto nós não temos barreiras salvo as paredes de casa e as portas e janelas e aplicativos de entrega, os serviços que pagamos como se fossem dignos de marajás, a ilusão de ascensão social dada pelos sites de compras, o cartão de crédito sempre no rotativo, a roupa que a marca esconde o escravo, a comiseração que vale apenas em palavra, a empatia que vem em doses pequenas, a vida que faz de conta que é boa para todos.

Não basta taxar apenas os ricos, há de taxar todos nós pelas vendas que usamos todo santo dia.

lembranças aleatórias não relacionadas com a infância

Lembrança #10 Lembro de uma festa ou rave ou balada que eu ajudei um amigo a organizar num tipo de sítio eu acho. Estava separado do meu nam...