Ler esta matéria do UOL apenas reforçou a ideia que já alimentava como certa de que ou você tem a lei da passabilidade ou estará fadado ao preconceito.
De certa forma, é irônico para não dizer trágico que o modelo de gay passável para o público hétero seja o gay feminino, travestido, escandaloso, pintoso, poc, ou qualquer outro adjetivo que você decida usar para designar esses gays que são sim parte do universo LGBTQ.
Aliás, nós gays cis somos os primeiros a discriminar esse tipo de gay, não queremos ser amigos deles, ter por perto, estar junto ou ter qualquer tipo de associação, servem quando muito para alívio cômico ou chacota, piada, exemplo de comportamento gay que apenas depõe contra a comunidade como se fossem algum tipo de câncer ou doença infecciosa que precisa ser contida e isso é um assunto que precisamos resolver e rápido se quisermos cobrar de fora o respeito que tanto desejamos.
A bem da verdade, há uma geração nova que está dando a cara a tapa e desconstruindo essas noções e estereótipos tendo como apoio e referência figuras nas artes que empoderam e legitimam tal representação o que é muito, mas muito importante.
Mas, dentro do universo normativo HT cis é lamentável que a figura do gay aceito seja ainda a que descrevi mais acima. Não é a toa que a personagem do filme de maior bilheteria do cinema nacional seja uma caricatura de mulher feita por um gay assim como, conforme a matéria, outros tipos de gays que seguem a mesma apresentação fazem e fizeram sucesso na TV e cinema.
Para o publico normativo cis HT esse é o tipo de gay palatável, que desce fácil, que se reconhece como gay porque agrega toda a carga estereotipada que a sociedade normativa identifica com o homossexual. É o que se espera dele, a bixa louca cabeleireira, a dançarina, a transformista, a exagerada, a caricata, a piada pronta, são os gays que a sociedade HT está preparada para aceitar em seu seio porque cumprem uma função pré-determinada e não tem qualquer traço que ameace a normatividade.
Muito menos são criaturas politizadas, políticas ou que enfrentam dramas próximos do cotidiano de qualquer mortal e, quando o fazem, é dentro de uma concepção definida por motores morais que não são corroborados pela maioria que enxerga em tais dramas apenas uma fraca emulação de conflitos pessoais dignos de nota.
Assim, quando temos em filmes, novelas e outros, gays representados como pessoas reais, que padecem de problemas reais, que tem dilemas reais, sentimentos reais e que demandam respeito e direitos que são reais para a maioria esmagadora dos héteros, esses personagens são ignorados ou mal vistos, rechaçados ante a aproximação periculosa que tem com as pessoas ditas normais.
O gay não pode ser visto como gente porque se for, o outro terá de confrontar sua visão do gay padronizado pelos estereótipos herdados e reforçados e que lhe é bem mais agradável sem controvérsia ou questionamentos sobre a validade de sua luta por direitos inerentes a qualquer pessoa ou direito de existir como seres humanos.
O gay da família é aquele que está lá para fazer rir, fazer troça com o que o pai e a mãe não podem mas ele sim porque é gay e se espera dele que seja engraçado e afetado. Se ele demonstra que possui sentimentos e que pode construir laços afetivos ou que possui sim uma sexualidade e que pode e deve expressá-la livremente, essa mesma família que antes o adorava passará a execrá-lo por estar ameaçando a fábrica do tecido social que julgam serem os patronos.
'Ah! Mas então não pode ter gay afeminado? Não pode ter as femininas?' você pode argumentar. Claro que sim! O problema é que só existem elas na concepção normativa pelas razões que expus acima e todas as gays que estão desconstruindo essa questão mas que não se enquadram no padrão normativo que se espera delas sofrem sim uma carga enorme de preconceito pois estão lutando por algo mais que fazer rir ou servir de piada pronta.
A medida certa desse tipo de preconceito pode ser sentida na situação comum - já vivida por mim e meu marido - que gays cis passam quando recebem a famosa frase 'Mas você nem parece gay..', essa é a pior frase que você pode falar para um gay pois a carga homofóbica que ela carrega é imensa e apenas corrobora o que expus até aqui, que o gay só é aceito e reconhecido como tal quando corresponde à imagem do gay que vive na imaginação social, quando foge disso há uma incapacidade de identificar a pessoa como gay já que ela tem a passabilidade ou seja, parece hétero e assim, não pode ser gay porque gay é daquele jeito que todos imaginam.
Resultado: bug geral, tela azul do Windows.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
lembranças aleatórias não relacionadas com a infância
Lembrança #10 Lembro de uma festa ou rave ou balada que eu ajudei um amigo a organizar num tipo de sítio eu acho. Estava separado do meu nam...
-
Lembrança #10 Lembro de uma festa ou rave ou balada que eu ajudei um amigo a organizar num tipo de sítio eu acho. Estava separado do meu nam...
-
seis horas, ave maria, rosário na mão para entrar no vagão cheio. vai com a turba, vai fundo, não tem volta, apenas vai. seis horas, ave...
-
eu não, eu não e você eu sim, eu sim. essa dicotomia foi se arrastando pra dentro de nós com o tempo, matando aos poucos, pressionando se...
Nenhum comentário:
Postar um comentário
one is the loniest number...