15 de jul. de 2020

o drama que eu não sei por em palavras

quando eu te beijei e você me beijou e nós nos beijamos naquele pântano onde beijo era flor deixamos de ser sapos para nos tornarmos homens. não príncipes que isso é coisa de sonho, inventado, placebo para deixar a mente nervosa cheia de fantasias de amor dormido, comido, sonhado entre copos de café desses que ficam o dia todo na garrafa térmica e pães dormidos.

fica comigo você disse.

por quanto tempo eu perguntei.

pra sempre você disse.

eu ri porque ali nada era para sempre e tudo era para sempre agora, momento, passa, piscou já foi. quando a gente é jovem, para sempre é muito tempo. quando somos adultos, para sempre pode ser uns meses ou anos. quando somos velhos, bem, quando somos velhos para sempre já não existe mais.

nos amamos na carne, ali, em pé, quem ama como nós aprende a amar em qualquer posição porque não há disposição que nos permita amar em outras posições e nossa posição é não abrir mão do amor mesmo quado ele se posiciona contra a gente.

saímos de lá cegos, surdos mas de mãos dadas, não fisicamente mas em pensamento, tem coisas que a mente faz melhor que o corpo eu acho. bebemos alguma coisa num boteco qualquer e eu queria ser mais articulado para ter convencido a mim mesmo de que eu amava, mas eu era coito interrompido, você sabia eu acho, já era mais do que eu, tinha certezas que para mim eram rascunhos, eu ainda tateava no escuro do desejo enquanto você já tinha encontrado as saídas.

nos despedimos. ou não. não lembro ao certo, talvez, não sei. sei que uma semana depois estávamos juntos de novo, ou quase porque eu cheguei no horário àquele pântano com cheiro de desinfetante barato e semente de homens e não te vi ou não queria te ver, ou não queria te encontrar, ou esperava que não viesse, ou torcia para que se atrasasse além de qualquer espera razoável e assim, eu poderia ir embora tranquilo ou menos nervoso.

dizem que o que gente pensa molda o mundo ao nosso redor. você não chegava, eu resolvi ir embora. aliviado mas triste. aliviado mas com raiva, aliviado mas puto. aliviado mas decepcionado. ali viado. e quando eu ia entrar na estação de metrô dou de cara contigo. contágio, letárgico, pandemia, epidermia, taxidermia de sentimentos, gelei e você com olhos dizendo achei que você não viria mas você veio e eu me atrasei e você ia embora e eu quase te perco mas olha que coisa que nos trombamos assim então era para ser e a gente vai ficar então.

sim. o universo tem bilhões de estrelas, galáxias, constelações e tudo mais. deveria estar mais ocupado criando e destruindo mundo, sugando estrelas e parindo mundo mas, ele parece ter mãos invisíveis, milhares delas, milhões talvez e às vezes, ele pressente que num planeta besta como o nosso, cheio de gente que não vale a poeira de um estrela, alguém precisa de um empurrão, de uma ajuda, de um incentivo e faz das suas.

fez de nós. depois desfez porque ele tem dessas também, não se importa muito com a gente e da mesma forma que nos junta, nos separa sem muito pesar. é assim que funciona. é assim que as coisas são. é assim que a gente é, deixa de ser, fica sendo e nunca é.

até hoje quando eu espero alguém que se atrasa, penso no que esse atraso pode me trazer e tenho vontade de atrasar os ponteiros só para ver se acontece de novo mas aí eu lembro que os ponteiros do relógio medem um tipo de tempo e que o universo mede outro tipo de tempo e que nesse meio tempo quem está perdendo tempo sou eu.

e eu fico então só lembrando desse dia quando o tempo deu certo para nós dois e esqueço do tempo até alguém me lembrar dele...


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