18 de nov. de 2021

a liberdade de (ex)pressão

 



Somos livres ou quase ou nem tanto ou talvez ou não ou apenas um pouco, medir a liberdade é algo confuso, complexo e muito subjetivo, ser livre é uma ideia e ideias são construídas diariamente e não fixas e imutáveis e perpétuas porque se forem morrem, toda ideia arraigada num momento do espaço/tempo está fadada a desaparecer, precisamos ser ventiladas e adubadas e atualizadas ou viram verdades universais e, ainda que algumas delas assim sejam, fechar a possibilidade de progresso e mudança de ideias é dar tiro no peito da evolução humana.

Todos somos livres a nossa maneira, dizer que somos mais ou menos livres do que outros é errado porque a liberdade de um pode ser suficiente enquanto para outro pode ser pouco, liberdade pode ser apenas escolha ou determinação, pode ser ir e vir ou ficar onde se está, pode ser falar e calar e dizer e sentir e viver e amar, pode ser muito ou nada e pode ser tudo ou nada e pode ser quase ou nunca mas, ela é e existe e precisamos dela para seguir vivendo.

O problema da liberdade é que ela não é irrestrita ou sem fronteiras ou sem limites mesmo que você pense que as quatro paredes de se celular assim o digam, não, ela não é, essa sensação de livre e solto existe ali apenas porque você está confinado num ambiente que lhe proporciona 'segurança' e sentimento de pertencimento e não precisa expor sua voz e face e ideias publicamente no sentido físico e carnal da palavra, na internet somos anônimos conhecidos e na vida aqui somos conhecido anônimos.

Mas, acima de qualquer ideia ou conceito ou teoria ou imaginação, ser livre é ter liberdade para poder falar e pensar e dizer e expressar suas ideias e opiniões sem medo de represálias, censura, cancelamento, banimento, linchamento, ofensa ou qualquer ação, atitude ou ato que cerceie esse princípio mas, não sabemos mais onde começa a liberdade de expressão e começa o aprisionamento de ideias e existe uma diferença muito sútil entre eles que pende para um ou outro lado conforme convém a quem puxa a corda.

É óbvio que a liberdade de expressão não deve ser usada para disseminar notícias falsas, discursos de ódio, preconceito, racismo ou qualquer outra coisa que ponha em risco ou ofenda e ajude a humilhar qualquer um de nós seja por nosso orientação sexual, identidade de gênero, raça, estrato social ou seja o que for porque hoje, tudo que é diferente e que nos faz sermos únicos enquanto humanos pode ser motivo de exclusão.

Quando usamos do manto da liberdade de expressão para justificar ideias estapafúrdias, negacionismos ou a criação de uma realidade na qual apenas alguns de nós acreditam veemente e cegamente, estamos corrompendo a essência desse princípio em prol de uma narrativa distorcida e irreal que presta serviço a regimes totalitários, absolutistas e que temem a liberdade de expressão quando não ela não vai de encontro a expressão de liberdade entendida por quem detém o poder e, via de regra, ao serem confrontados com seus discurso torto e arbitrário, tais pessoas vestem o manto da liberdade de expressão e caem aos prantos dizendo que são perseguidas e que não podem, de forma livre, expressar sua opinião contrária, patrulha ideológica, esquerdopatia, comunismo e jamais será vermelha.

Liberdade de expressão é poder discordar do outro embasado em pensamentos e argumentos lógicos e dialogados, é discutir sua visão de mundo e opinião sem que seja preciso enterrar a opinião alheia sob uma pá de cal. É não pregar a mentira como se fosse verdade e não tomar a verdade por sempre mentira e metralhar quem expõe os fatos pois eles não são reais dentro de sua concepção de mundo, é compreensível que pensemos de formas diferentes, se todos pensássemos igual, o mundo seria um daqueles memes onde todos estão felizes e dando de comer a animais selvagens nas mãos, mansos e sorrindo num por de sol idílico.

E o que digo acima vale para todos e não apenas para quem se acha do lado certo da história ainda que, hoje em dia, seja fácil saber quem está do lado errado pois não há como não saber qual lado é o errado vide a barbárie e cascata de factóides que recebemos todos os dias. Quando promovemos a cultura do cancelamento, do banimento, da censura seja por qual motivo for, por mais justificado que possa ser, estamos agindo de forma idêntica a quem está do outro lado, obviamente que não há mais como aceitar certos tipos de ações, comentários e expressões de preconceito, passamos desse tempo em que aceitávamos rindo amarelo as piadas e ofensas mas, se não tomarmos cuidado, acabaremos vivendo numa bolha sem brilho e sem cor junto com nossos detratores pois, como disse, é uma fronteira desenhada a lápis entre um extremo e outro.

Não podemos banir ideias (ideias e não preconceitos ou outras manifestações afins) porque elas simplesmente não encaixam com a visão de mundo atual, precisamos debater, discutir, entender e então decidir se essas ideias merecem atenção ou devem ser descartadas pois não trarão nada de construtivo para nossas vidas. Ao simplesmente cancelarmos e banirmos tudo que nos parece errado sem tentar ao menos entender de onde saiu a ideia e o que a motivou estamos matando o livre pensar e fechando a nós mesmos num mundo incolor e sem vida, onde todos pensamos igual e estaremos fadados ao marasmo eterno.

Volto a dizer que isso não é abertura para o ódio ou justificativa para expressões do horrendo em nós mas um pedido para que sejamos mais flexíveis em ouvirmos uns aos outros, debater nossas ideias e posturas diferentes e sair disso com visões de mundo que sejam benéficas a todos e, se não for possível, que sejamos capazes de conviver com nossas diferenças respeitando que são elas que nos tornam especiais.

Ao banirmos o diferente estamos matando o que nos faz humanos e pensantes, nossa espécie não chegou onde está (ainda que aos trancos e barrancos) matando ideias mesmo que tenhamos tentado arduamente por toda a nossa história. Chegamos aqui justamente por termos debatido, discutido, confrontado, questionado, dialogado e estarmos abertos, mesmo que contra nossa vontade, a ideias e pensamentos novos.

Perdemos a arte do debate e diálogos sadios, melhor banir e ofender e bloquear e banir do que tentar entender o outro, porque ele pensa daquela forma e como e se podemos fazê-lo mudar de ideia ou chegar ao um meio termo, estamos cada um de nós cravados em nossos extremos e não queremos arredar o pé pois temos a certeza de que estamos certos e do outro lado idem e assim seguimos cada vez mais isolados e distantes e sempre achando que o problema é o outro não nós mesmos.

Liberdade de expressão é poder expressar sem pressa e sem pressão o que você pensa, sem medo de represálias, sem medo de escolher palavras, sem medo de ter ideias e, muito importante, de forma consciente e madura para os questionamentos, julgamentos e opiniões contrárias e, porque não dizer, consequências de nosso pensar.

Ao minar essa responsabilidade mental estamos matando lentamente o que mais precioso temos como humanos.









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