6 de dez. de 2021

the sound of music

Fim de ano e todos os aplicativos fazem a já conhecido retrospectiva.

Fico imaginando se os aplicativos se sexo e encontros também fazem, como seria? Mostrariam todos que saímos, recusamos, ficamos, fodemos, curtimos, quais os mais woofeados, os menos, qual seu score no mundo dos apps mas, acho melhor que esse tipo de aplicativo não faça isso, seria um golpe fatal em muito egos já frágeis e combalidos e que não suportariam esse golpe virtual mesmo porque, pode ser que tal retrospectiva traga memórias não muito agradáveis então, melhor deixar as lembranças sexuais e eróticas para um segundo momento afinal, o que o sexo não vê, o coração não peca.

Pensei mais na música e nas retrospectivas dos apps que usamos para escutá-las e no algoritmo que a tudo vê, tudo sabe, tudo conhece, tudo acusa e tudo controla. Esse resultado pode representar, para o universo virtual, um recorte de tudo que ouvi no ano mas é apenas isso, um recorte, eu fiz e ouvi muito mais do que ali informa, não é só aquilo, aquilo é o que o algoritmo pensa de mim e não me contém.

Mas, o que mais me surpreendeu foi ler, nos comentários das retrospectivas gerais feitas nos feeds dos apps, gente reclamando e diminuindo as listas de artistas mais tocados expressando opinião de que o Brasil não tem mais salvação, país sem cultura, sem esperança e jogado na latrina da intelectualidade simplesmente por ter, nos artistas e músicas mais tocados, funk, sertanejo, sofrência e outros ritmos e músicas que não estariam no panteão da alta música popular.

Eu não ouço nenhum desses gêneros, sou chato para música e não gosto de boa parte da chamada nova geração da música brasileira e não por ser elitista ou metido a intelectual mas apenas porque essa nova safra não dialoga comigo, não diz nada que eu queira ouvir e não me agrada então, passam longe dos meus fones de ouvido mas, isso não quer dizer que não tenham valor, talento e que não representem a voz de uma geração.

Dizer que estamos na merda cultural porque os artistas mais tocados são do funk, sertanejo, samba, pagode, new drag music ou seja o que for é desmerecer a cultura nacional e sua representatividade, não é preciso diminuir uma geração para valorizar outra, o tempo é mestre e senhor e o que foi essencial para minha geração pode não ser para essa de agora, os valores são outros, as vozes são outras, as necessidades são outras e os espaços são outros então que tal respeitar o gosto alheio e pelo menos reconhecer que se não está sendo feito algo que nos agrade, está sendo feito algo que tem sim relevância?

Dizer que funk só fala de putaria e não tem conteúdo é uma diminuição grotesca de um movimento não apenas musical mas cultural, não me agrada mas é uma revolução e traz e dá voz a muitos segmentos sociais e minorias e, se fosse tão ruim assim, não teria caído no gosto da maioria ainda que se possa argumentar que 'toda unanimidade é burra'. Dizer que sertanejo e sofrência são ruins é igualmente desfazer de um movimento que trouxe sim ares novos e representatividade para a música assim como outros movimentos e artistas como Pablo e outros tantos LGTBTQIA+ que abriram e estão abrindo espaço em tempos de tantos retrocessos.

Precisamos entender que a cultura não é uma deusa intocável que só vive de elitismos e normas cultas mas uma entidade viva que precisa estar inserida em seu tempo e dialogar com as pessoas, ter a cara delas e deixar que se expressem e mostrem que tudo que é feito pela sociedade é cultura, desde os slams até os saraus, dos museus ao pancadão, tudo é manifestação cultural, precisamos parar de agir como someliers culurais dizendo o que tem e não tem valor só porque não caiu em nosso gosto ou não atende a uma norma pré-estabelecidada.

Quem estabeleceu essa norma e essa regra? Quem define o que é bom ou ruim culturalmente? Eu? Você? Não! Quem define isso é quem consome a cultura, quem precisa ver nela sua cara e sua voz e a cultura tem espaço para toda e qualquer manifestação, para todos expressarem sua voz então, que tal deixar que cada grupo ocupe seu espaço e viver de boas?

Se ficarmos torcendo o nariz para o vizinho porque ele não atende ao nosso gosto estamos fragmentando tudo e deixando espaço para o monstros dividirem ainda mais o que custamos tanto para conquistar....

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