22 de jan. de 2020

Diga-me onde moras e te direi se terás emprego...

A cidade é um monstro imenso que diariamente devora gentes e caga restos humanos que adubam o dia seguinte para começar tudo de novo.

Locomoção em SP é para os fortes. De estômago, de espírito, de alma, de corpo, de ânimo, de vontade e tudo mais. Já conheci gente que gastava todo dia cerca de cinco horas no trajeto casa-trabalho-casa, considerando um jornada de oito horas e um dia de vinte e quatro, essa pessoa consumia mais da metade de seu dia no transporte público tendo de dividir o que sobrava entre outras atividades como lazer, estudo e porque não dormir.

A cidade cresceu de forma completamente desordenada empurrando parta bairros cada vez mais distantes a maioria da população incapaz de acomodar num orçamento apertado o custo de vida exorbitante de morar próximo ao trabalho, privilégio reservado a elite branca cis da qual eu, não há como negar, faço parte.

São essas pessoas que gastam tempo se locomovendo pela cidade que movimentam a máquina branca que está pouco se lixando em saber quantas conduções ou baldeações serão necessárias para que a diarista, o porteiro, o entregado e outros prestadores de serviços cheguem a seus destinos e cumpram com sua função de não deixar a elite branca sem seus mimos.

Como se não bastasse isso, a sociedade e o governo não se cansam de tomar medidas que tornem apenas mais difícil esse deslocamento vide o preço de $4,40 pelo coletivo e metrô, o cancelamento de diversas linhas de ônibus principalmente ligando os bairros mais distantes ao centro e bairros nobres e o metrô que faria qualquer cidade que se auto proclame metrópole corar de vergonha.

Esse mecanismo perverso não pensa em facilitar o acesso dessas pessoas ao trabalho mas sim impedir seu acesso ao lazer e cultura fora da periferia que, segundo pensam, é onde devem ficar essas pessoas e por lá mesmo ter seu lazer, promover sua cultura e viver suas vidas aos finais de semana, feriados e dias santos desde que não seja o plantão. Nada de ir passear no shopping de rico, museu, cinema ou teatro, nada de ir ao parque onde as madames e playboys vão correr e passear com seus filhos de raça, muito menos marcar rolê nas cercanias de bairros nobres.

Por isso bairro de rico não tem transporte e quem precisa lá chegar tem de penar e muito para fazê-lo sendo obrigado a caminhar ainda uma boa distância já que rico não tem metrô na porta muito menos ponto de ônibus, onde já se viu!

Essa mesma exclusão acabe sendo responsável por aumentar os índices de desemprego de quem m ora muito distante do centro ou grandes centros de emprego vide esta matéria aqui que elucida bem o assunto. Não é de surpreender que a maioria branca seja a que tenha mais fácil acesso ao trabalho e oportunidades de emprego já que não precisam cortar a cidade de um extremo a outro para isso.

Acontece que parte dessa elite branca, digamos os não tão ricos quanto a maioria dos demais brancos - eu incluso, está cada vez mais enfrentando dificuldades em 'morar bem' já que vários bairros como a Vila Buarque, onde resido, estão passando por um processo de gentrificação e consequente especulação imobiliária o que faz com que os preços não apenas do imóveis mas de tudo ao redor fique muito mais caro do que o normal e assim, afastando boa parcela de moradores originais do bairro ou permitindo que pessoas que desejem morar na região o façam jogando para os bairros mais distantes todos que não podem arcar com o luxo de morar num bairro 'novo' ou 'renovado' e assim, i ciclo se mantém e não se quebra.

Não bastam apenas políticas públicas para resolver esse problema mas certamente que sua solução passa por elas, é preciso que nós mudemos nossos hábitos e tenhamos empatia em reconhecer que o problema não é apenas de um mas de todos nós e, para deixar claro como ainda não conseguimos pensar assim, deixo o exemplo que uma amiga me deu há algum tempo.

Ela conversava com algumas pessoas no café da empresa, algumas reclamavam que por conta dos corredores de ônibus, estavam levando mais tempo que o usual para chegar ao trabalho de carro. Ela argumentou que para as pessoas que usavam o transporte público, os corredores faziam uma enorme diferença pois representavam uma economia de tempo para essas pessoas que poderiam, com esse tempo extra, talvez chegar mais cedo em casa, na faculdade e ter uma qualidade de vida melhor.

Foi tratada feito um alienígena e a conversa ficou por ali mesmo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

one is the loniest number...

lembranças aleatórias não relacionadas com a infância

Lembrança #10 Lembro de uma festa ou rave ou balada que eu ajudei um amigo a organizar num tipo de sítio eu acho. Estava separado do meu nam...