30 de nov. de 2020

prato feito

 



Antes de qualquer coisa, deixo claro que não tenho a solução para esse ou qualquer problema e que as opiniões que expresso aqui são minhas e tão somente minhas, sinta-se livre para concordar, discordar e parar de ler se for o caso.

Ainda estamos na 'ressaca' desse caso horrendo, parece meio chover no molhado falar dele e de como indignou a todos nós, parece pouco seguir falando dele, parece nada não falar e deixar o Carrefour soltar notas de desculpa e inserções em horário nobre de seu presidente branco europeu fingindo um horror lido nas placas pois era incapaz de decorar um texto simples ou mesmo falar de improviso que teria sido mais humano e sincero.

O horror maior entretanto veio de quem governa, de quem mama nas tetas do presidente, lhe lambe o cajado e as botas cheias de merda. Não existe racismos no Brasil! Que coisa maravilhosa, gente! Somos talvez a única nação no mundo que erradicou esse câncer! Serei forçado a votar no coiso por esse feito tão incrível! Racismo no Brasil? Onde? Estão importando coisas de fora para tumultuar a sociedade, Brasil é um país misturado, um caldeirão cultural e racial, somos todos pretos e pardos e índios e brasileiros.

E vem o cidadão de bem comentar nas redes e sites que estão fazendo massa de manobra, que o cara era meliante, tinha ficha, era agressor, assassino condenado, batia na mulher, era estuprador e outros, tudo para justificar que ali foi apenas a lei do retorno, que ele teve o que mereceu e que coisa boa não deveria estar fazendo senão, não teria morrido, essas coisas que todo cidadão de bem adora repetir para não ter de encarar a triste realidade dos fatos.

O caso Carrefour não é isolado, acontece todos os dias em todo lugar mas a gente faz de conta que não acontece, não vê. O Carrefour tem histórico: em 2009, funcionários da unidade de Osasco espancaram um homem negro sob alegação de que ele estaria tentando roubar o carro que era dele mesmo. Em 2018, um homem negro deficiente foi espancado na unidade de São Bernardo do Campo porque abriu uma lata de cerveja dentro da unidade. Entre 2017/18, uma mulher negra e dependente química foi espancada e estuprada numa unidade do Rio de Janeiro e fora os caso do cachorro que foi morto por um segurança da loja e daquele outro caso de uma pessoa que morreu dentro da loja que seguiu funcionando normalmente tendo apenas coberto o corpo com guarda-sóis.

O Carrefour aparece porque é uma empresa grande, gigante, internacional mas casos iguais ou piores que acontecem diariamente em outros estabelecimentos passam batido por nós e pior, de tanto vermos casos assim acabamos normalizando sua ocorrência, mais um, acontece sempre como qualquer outra coisa numa cidade grande e num país como o nosso.

O pior é que lutar contra isso é uma tarefa ingrata, tipo enxugar gelo porque boicotar a empresa pode parecer um ato viável mas na verdade pouco tem de efeito porque as pessoas seguem comprando na rede e não seria apenas boicotar o supermercado mas as marcas que fazem negócio com ele e que também tem culpa no cartório mas se fazem de isentas porque não vão perder bilhões em vendas. Não adianta pressionar o Carrefour, temos de pressionar a Unilever, a Coca-Cola, a Nestlé e todas as grandes marcas que também pecam por omissão e tem sim casos de racismo, homofobia e outros em seus catálogos, uma tarefa praticamente impossível já que boa parte das marcas que consumimos estão nas mãos dessas e outras empresas que controlam tudo que consumimos mundialmente.

Além disso, há o fator social e político, quando o governo se faz de besta e prefere proferir absurdos, sandices e imbecilidades ao invés de encarar de frente o problema, incita a parcela da sociedade que pensa igual a fazer a mesma coisa e normalizar e relativizar casos assim tomando sempre a vítima como culpada e duvidosa, se apanhou ou morreu é porque coisa boa não era, se fosse gente de bem não teria acontecido nada, se fosse gente branca de bem, obviamente.

Enquanto aceitarmos tacitamente declarações estapafúrdias de governantes imbecis e pedidos de desculpa corporativos vazios cheios de medo da queda nas ações e não de culpa, estaremos no mesmo barco que o Carrefour e todos os que acham que a vítima é sempre culpada.

Um comentário:

  1. Excelente, amigão! E a luta contra essas e outras trevas continua. 😍

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