4 de fev. de 2021

mariska

samara mulher vem logo, vamos atrasar! afff que pressa to acabando de fechar a mala! mulher, é um fim de semana na praia, não é paris! você sabe como eu sou, não saio de casa despreparada, nunca se sabe! mulher, o que vai acontecer lá que não poderia acontecer aqui? nunca se sabe! tá mas corre que já estamos atrasadas pelo amor da virgem!

areia fofa, água fria, praia vazia, sol tímido dando piscadas por entre as nuvens, olhos atentos olhando de lado as mulheres na praia, bebendo, conversando, cantando alto, um rádio alto tocando qualquer coisa que elas cantavam de qualquer jeito, pequenos pratos de petiscos passando de mão em mão, uma felicidade efêmera feito maré, a felicidade é uma maré alta que só faz atolar que deseja nela nadar.

praia uó. uó onde? vazia, gente! também achei! mas calma mulher que ainda está cedo, a gente veio direto, só largamos as coisas em casa e viemos, as bichas queriam ver o mar, nem deu tempo de tomar uma ducha, só por o biquini. nem deu tempo de fazer a chuca. e tu ia fazer pra que? vai atender logo cedo aqui mulher? nunca se sabe, a gente pode até estar de férias mas quando aparece a chance de faturar... isso é, ah isso é! afff vamos pensar em outra coisa que só dinheiro me cansa! dinheiro te cansa bicha? cansa ué, só fala disso! e por acaso a senhora ficou rica e não nos contou? isso mesmo, ganhou na mega sena e ficou na miúda? acho que ela tirou a sorte, tem macho aí, sinto cheiro! vocês são umas recalcadas, isso sim, nada disso, só estou falando que falar de dinheiro toda hora enjoa, viemos aqui ara descansar porra! e desde quando a gente cansa de falar de dinheiro?? só vou cansar de falar dele quando não precisar mais falar dele! eu também, quero mais! vai que a gente cruza com um gringo rico aqui e tira a sorte! vai sonhando gata. afff que invejosa você! invejosa não, realista, qual gringo vai te querer, se enxerga viado! se enxerga você bixa escrota, toda cheirada que eu vi antes de sair do apê! cheirei mesmo porque pra aguentar ficar nessa praia errada com vocês mariconas só colocada mesmo! pois pode voltar querida que ninguém aqui vai sentir sua falta! parem agora! viemos aqui para descansar, beber e relaxar, não viemos para trepar nem para trabalhar nem pra nada, se vocês não conseguem aproveitar pelo menos um momento de paz então vão toda pra merda, peguem suas coisas e voltem pra cidade e me deixem em paz, vocês só fazem reclamar e reclamar, nada nunca está bom o bastante, nada nunca é o bastante, ou calam a boca, ou mudam o clima ou vão embora.

silêncio de ondas quebrando cansadas na praia, o sol aberto espantando as nuvens e um chiado distante feito um tipo de memória caduca.

queria comer camarão. essa nasceu com cabeça de rica e bolso de pobre. qual problema? nenhum querida, se você pagar, todas vamos amara comer camarão. pois eu pago para as mortas de fome que eu trabalho para isso, oras. samara está esbanjando. deixem ela, oras! ela faz com seu dinheiro o que achar melhor, não vejo vocês usando o dinheiro de vocês melhor do que ela. a senhora fala porque ela é sua protegida. bicha, se eu não estivesse de férias, eu juro que cortava sua cara de cima abaixo pra você aprender a ater algum respeito mas, como estou afim de relaxar, samara, pega aqui querida e vai lá na barraca e manda vir um porção de camarões graúdos, não quero miséria e também uns mariscos no limão.

comeram. fartaram-se. não falaram. comeram como se não houvesse amanhã mesmo porque, para elas o amanhã era algo sem cor, sem nome, sem endereço, sem rumo, sem casa.

samara mulher, você está bem? acho que não, acho que exagerei, mulher, to me sentindo mal. mulher, eu avisei pra tu não comer tanto camarão e marisco, ainda mais marisco, essas coisas fazem mal ainda mais para quem não tem o costume. ai to me sentindo estranha. toma uma coca que passa bicha! que nada, uma caipirinha! doida, onde já se viu tomar cachaça, toma água! ela tem de ir por hospital! e hospital vai atender ela, mulher? samara, tu tá pálida! vou vomitar, vou vomitar, to me sentindo muito mal e saiu correndo em direção ao mar com a mãe logo atrás as outras olhando de longe meio sem entender o que fazer ou como ajudar ou pensando que ela estava mal por gula ou porque era uma sem jeito ou porque não tinham nada que ver com aquilo mesmo, a vida para elas era um mar de ilhas que, a distância, ficavam olhando umas as outras afundando lentamente.

samara caiu de joelhos ante o mar sereno que ia jogando ondas que apagavam seu vômito, atrás de si a mãe bicha lhe segurando os cabelos.

isso, mulher, bota pra fora que via te fazer bem. ai minha mãe, que vexame! afff, onde? a senhora em sua férias e eu aqui dando trabalho e aquelas só reclamando. meu bem, ser mãe é isso, um dia você será também e vai saber como é. eu queria ser mais feliz sabe? oras, e tu não é? sou? não sei...samara, minha filha, se você precisa ficar se perguntando se é ou não feliz então com certeza não é, a gente passa a vida toda se perguntando isso e quando morre, descobre que não precisava porque tinha sido feliz e não tinha se dado conta, se você perder tempo se perguntando se é ou não feliz, vai esquecer de ser feliz e perder a vida tentando responder essa pergunta que, sinceramente, não precisa de resposta. acho que to melhor. mesmo? sim, meio zonza mas melhor. que bom! sabe de uma coisa? o que, minha filha? lembra quando a senhora ralhou comigo por ter escolhido me chamar samara? afff isso já foi, é teu nome amor e tu que escolheu! pois, não quero mais. não quer mais? não, quero outro nome, quero um nome forte, quero um nome de  mulher de verdade, quero um nome bom. e qual nome tu quer minha filha? vou me batizar aqui, com o mar e com você de testemunha. claro, minha filha, o mar não poderia ser melhor padrinho, sempre soube que tu era dele, qual nome tu quer para que eu e ele abençoemos tua escolha?

mariska, com k. 

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