11 de dez. de 2019

Aberto/ Fechado

Antes de começar o texto creio ser de bom tom informar que não tenho a receita para um relacionamento perfeito seja lá o que isso for. A perfeição é um conceito imune ao humano e nociva enquanto padrão já que é excludente de qualquer normalidade que exista implicando em si e em nós conceitos intangíveis e inatingíveis.

Sábado passado estávamos numa mesa de bar, local predileto de filósofos, amantes, bêbados obviamente e tudo isso junto e misturado porque é no bar que nasce a vida e no bar ela acaba quando voltamos para matar a ressaca de antes ou as memórias de sempre.

Enfim. Estávamos. Hidratados com aquele néctar dos deuses e alambiques e adegas e vinhas e por aí vai quando o assunto descamba para monogamia, relacionamentos abertos e suas variações. Acho que, imbuído de álcool, talvez tenha feito uma palestra não desejada mas não menos honesta ou coerente.

Explico, pode ser que leias abaixo cousas que não lhe agradem, lamento e eu realmente não dou a mínima.

Há que esclarecer que amor é amor e sexo é sexo. Sim. Não faça cara de espanto ou venha com aquela frase de que sexo sem amor não existe ou essas invencionices, ambos existem em dimensões totalmente distintas mas intercomunicáveis quando necessário.

O conceito de que o sexo só pode existir com amor foi a invenção e convenção social, moral e judaico-cristã mais absurda que já existiu e que serve apenas para manter a todos com medo do pecado cristão, na rédea para que a sociedade não se transforme numa suruba sem fim e sem freios e sem dono - não que ele não o seja mas sem o sexo, infelizmente - e principalmente, resguardar o dinheiro e posses das grandes famílias tradicionais do poder, o poder em si, a empresa católica rica e funcionando com base na culpa incutida no sexo sujo e tudo isso funcionando de modo a perpetuar o status quo e estruturas sociais vigentes.

Some na equação o conceito de amor romântico idealizado pela arte e reforçado pelos preceitos religiosos de que deve ser e estar acima da carne, esse amor romântico é colocado num patamar de divindade no qual todos nós sacrificamos a vida toda na busca por algo que jamais será alcançado pois é impossível e assim, seguimos em seu encalço acostumando-nos a simulacros de amor com ou sem sexo para encher o vazio que nunca será preenchido.

Transmitimos isso de geração para geração e mais gente passa a vida acreditando que amor deve ser buscado sempre e o sexo deve ser evitado quando possível e que só pode existir em sua plenitude quando acompanhado do primeiro e, se você for mulher, tanto pior pois o amor é uma herança que jamais lhe será concedida e o sexo deve permanecer como prerrogativa do macho que lhe mantém, ao homem é concedido separar amor e sexo pois se espera dele que espalhe sua semente em tantos vasos quanto for possível mas a mulher, esta deve ser apenas do amor e o sexo deve ser sepultado e velado se ela se torna a mais santa da criaturas, mãe.

Esses são modelos de relacionamento e conceitos heteronormativos que nós gays emulamos à perfeição porque até bem pouco tempo - em termos de história - não tínhamos outros ou sequer sonhávamos em construir algo diferente.

Mas, vejo com alegria que estamos contestando tudo isso e criando novos modelos de relacionamentos e amores e sexos totalmente destoantes dos vigentes e, salvo aconteça alguma tragédia e nos tornemos uma teocracia, creio que teremos gentes mais livres e libertas do jugo da moral cristã e aptas a amar da forma que lhes for mais conveniente e quem lhes apetecer.

Mas você não crê no amor? Ouço a pergunta desse lado aí.

Sim. Muito. Demais. Incondicionalmente e piamente.

Acredito no amor e acredito que sexo com alguém que amamos é uma das coisas mais próximas da divindade que existe mas o amor que acredito não escraviza, não é dono de ninguém, não exige nem demanda, não impõe, não fere ou agride.

Quando dizemos EU TE AMO devemos dizer apenas isso, que a pessoa tem uma importância enorme em nossa vida e que ela precisa estar conosco, ao lado, sempre, porque sua presença nos faz bem, é desejada e querida e não que ela é nossa ou nos pertence. Não pertencemos a ninguém que não seja nós mesmos, deixar-se ser de outro é abrir mão de si e de tudo que você pode um dia vir a ser na vida, jogar essa responsabilidade nas mãos de outra pessoa é caminho certo para o desastre pois com o tempo você olhará a culpa que é sua instalada naquela pessoa em que você investiu tanto.

Não podemos possuir ninguém mas podemos amar a todos, atribuir para si que o amor deve ser mutuamente exclusivo é podar as asas de uma ave rara e condená-la a rastejar, desastre na certa. Você se sente capaz de suprir a tudo que a outra pessoa necessita quando muitas vezes nem mesmo ela ou você sabe o que precisa ou quer? É arrogância pura exigir exclusividade e monogamia, é posse, é morte, é egoísta e não é amor.

E o sexo?

Ah! O sexo é apenas sexo gente, eu e vocês somos ANIMAIS, o sexo faz parte de nossas vidas e foi criado para dar prazer, a reprodução é um efeito colateral. Sexo com amor é bom? Claro que é, o melhor mas não significa que o sexo pelo sexo, o tesão, querer gozar, carne, luxúria e tais não sejam coisas boas.

Estamos há séculos sujando o bom nome do sexo, demonizando, perseguindo e tudo porque pessoas sexualmente livres são perigosas porque tem ciência de seus corpos e que o prazer não está nas mãos de outras mas em suas próprias e isso é muito perigoso.

Mas você sempre teve esse tipo de pensamento?

Não, adquiri essa consciência com o passar dos anos, amadurecendo e fazendo muita merda, brigando por razões fúteis e exigindo coisas que eu mesmo era incapaz de oferecer, mentindo, usando de subterfúgios e desculpas, um fardo que cobra seu preço pesado mas, consegui me livrar disso e quando o fiz descobri que era possível ser feliz sem atender expectativas que nunca foram as minhas mas dos outros e da sociedade.

Mas você é casado..

Sim. 17 anos. Não me vejo sem meu marido e ambos evoluímos muito em nosso relacionamento. Foi fácil? Não. Mas também não foi impossível bastou diálogo, respeito, honestidade e muito amor, essas coisas que vivemos falando para os outros mas nunca usamos em nós mesmos, não é?

Hoje quero alguém do meu lado que me deseje feliz e bem, que saiba que eu compartilho com ele uma vida que não compartilho com qualquer outra pessoa e que só consigo ver sentido em minha vida se ele estiver comigo mas, isso não significa que ele me pertence e vice-versa, não quero ser dono de ninguém e não quero que ninguém seja meu dono, não tenho nota fiscal, não fui tirado de uma loja.

Acredito piamente que relacionamentos abertos, poliamorosos ou outros são muito mais saudáveis o que não quer dizer que condene os relacionamentos ditos tradicionais, cada um de nós deve fazer o que julga melhor para si e se um casal encontra seu jeito de fazer as coisas funcionarem então está tudo bem!

Ninguém detém fórmula nenhuma e esses programas e livros de casais que pregam métodos e conselhos para fortaleces casamentos e afins são arapucas, cuidado! Apenas você sabe o que vai lhe fazer feliz, bem, o tipo de amor e de sexo que você quer, não deixo ninguém lhe dizer o contrário.

Amor é sexo e sexo é amor, às vezes eles vem juntos, às vezes separados, às vezes nem vem, às vezes não sabemos se é um ou outro mas se você souber como quer que eles venham vai ser muito mais fácil reconhecer quando chegarem.

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