3 de jun. de 2020

Controvérsia




Alguns discos parecem premonitórios e até mesmo proféticos e sabemos que ainda são atuais quando submetidos a pressão dos anos, eles seguem (guardadas algumas proporções) atuais.

Em 1981, Price lança seu quarto disco 'CONTROVERSY'. Pode parecer um feito meno para quem conhece a carreira do gênio mas, era seu quarto disco e ele ainda cuidadosamente tateava seu meio para ver quais caminhos seguir.

De certa forma, este disco é uma ponte entre o anterior 'DIRTY MIN' e o seguinte '1999' que alçou Prince ao estrelato (Purple Rain o elevaria ao mega-estrelato), como se ele estivesse elaborando um rascunho de '1999' pois muito da sonoridade deste é percebida em 'CONTROVERSY'. O disco em si é relativamente curto, oito faixas mas Prince já desenhava suas baladas de amorsexo extensas e cheias de erotismo em 'DO ME, BABY' e quase extrapolando os limites do vinil em termos de tempo com outra faixa extensa, a que dá título ao disco.

O sentido premonitório do álbum começa pela capa onde Prince encara de frente a câmera tendo ao fundo manchetes de jornais falsas e que emulam os títulos e temas das canções já antevendo o poder que notícias falsas podem ter e o estrago que podem causar. Este, aliás, é um tema recorrente no disco, Prince estava cansado de responder sobre questionamentos quanto a sua aparência, sexualidade e outros quando, para ele, o que importava era apenas sua música, somente ela deveria ser objeto de atenção. Obviamente, apresentar-se ao vivo vestindo apenas uma sunga, botas de salto e um sobretudo não ajudavam muito.

O disco todo é um ataque às vezes sutil, às vezes nem tanto a forma como a mídia manipula as informações e as distorce e um reflexo do início dos anos 80 quando havia uma incerteza sobre o destino do mundo e uma onde conservadora passava a dominar a América com o governo Reagan.

Da faixa título onde Prince diz não entender porque tanta curiosidade sobre sua persona e diz que melhor seria se todos estivéssemos nus e não houvessem regras, passamos por 'SEXUALITY' onde mais uma vez ele pergunta qual o problema das pessoas em lidar com a sexualidade tanto própria como alheia, o que deveria ser um meio de liberação acaba tornando-se meio de opressão. Caímos em 'DO ME, BABY' e não vou dizer nada, apenas ouça até final.

'PRIVATE JOY' segue como ode ao prazer solitário que pode ser interpretado como sua mão ou uma boneca inflável ou, se você preferir, consumo de drogas ou qualquer coisa que lhe traga prazer. A música acaba numa parede de guitarras distorcidas que emenda em 'RONNIE, TALK 2 RUSSIA' onde Prince pede ao mandatário que fale com Moscou antes que seja tarde demais.

'LET'S WORK'é um funk simples e cheio de groove, momento em que Prince simplesmente quer que você esqueça o resto e dance, nada mais. Porém, a faixa seguinte 'ANNIE CHRISTIAN', um pop eletrônico onde Prince declama a letra, faz alusão aos assassinatos de Atlanta, racismo, morte de Lennon e a violência que parece ter saído do buraco escuro onde vivia para aterrorizar o país. Perceba que o título da música é um trocadilho com ANTI-CRISTO.

O disco fecha com 'JACK U OFF', um rockabilly simples e curto onde ele volta a dizer que a única maneira de aproveitar a vida é gozando dela ou nela.

Muitas pessoas acham o disco irregular e até mesmo datado mas, pessoalmente, acho um disco foda e, como disse, premonitório além de atual. Prince evoluiu muito depois em sua carreira e, em alguns momentos, chegou a renegar trabalhos mais antigos mas, não porque os considerasse erros ou algo assim (salvo o BLACK ALBUM) mas porque ele pensava apenas no futuro, na música que ainda podia fazer e não na música que já havia feito.

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