16 de dez. de 2020

até que ela nos separe...ou una a todos...

 



Mais dia, ou menos dele, vamos todos bater as contas com a ceifadora. Fato.


É de nossa cultura, genético arrisco, vendermos tudo e todos a quem for para nos comprar aqui mais algumas horas, unhas e dentes atracados a isso que chamamos vida, essa bosta colorida que nos cega os sentidos e empanturra mais e mais e, mesmo assim, não fechamos a boca nem fazemos menção de largar o prato ainda que este possa se mostrar vazio ou, se você é desses, meio cheio, tomarnocu, viu?


Nem eu quero sair dessa pra melhor, meu chapa! E olha que nem creio assim nos portões de San Pietro ou nas labaredas sem fim de Mefistófeles ainda que acredite em conceitos meio que vagos de bem/mal. Mas, o peso que a morte nos faz carregar é demasiado, vai longe mesmo do valor da vida e nos faz esquecê-lo pensando apenas na hora final seja de forma direta ou indireta.


Trabalho quase utópico esse de nos fazer encarar a hora ruim com mais tranquilidade e adotar o fim como parte do começo mas, um dia há que se conseguir. Eu tento cá, do meu jeito, uns dias mais, outros menos e vou levando assim sabendo que cada dia deixado para trás e mais a frente para me deixar frente a frente com a juíza final. Nem sei como vou lhe olhar nos olhos descarnados, mais um problema, pintamos a morte de forma sempre horrenda e grotesca, embutimos medo em sua concepção e imagem sendo que nem mesmo temos como saber como ela é, se é e como vem nos buscar mas, como ante o desconhecido e mais fácil satanizar do que harmonizar, vamos indo aí com esse medo genético e hereditário de morar a sete palmos nesse último latifúndio (a parte que nos cabe de fato, ninguém tasca!).


Sempre fui avesso aos rituais mortuários, velórios e afins sempre me pareceram um séquito de sofrimento engajado em lhe fazer não esquecer a dor e não lhe deixar esquecer de seu destino certo mas, como todo resto de nossas vidas, é uma fase e como tal precisa de seus ritos de passagem e assimilação coisa que estamos paulatinamente ‘matando’ (não resisti) quando cremamos os corpos de forma rápida ou os enterramos com cada vez mais celeridade, impessoalidade e de forma a acabar com tudo aquilo o quanto antes o que é compreensível pois queremos é mesmo escapar da dor o mais breve possível.


Não podemos ignorar a morte mas, podemos meio que apagar sua passagem e deixá-la com área de parte da paisagem urbana desonerando seu caráter definitivo. Assim, cremamos os corpos para não termos mais que ir aos cemitérios nos lembrar menos dos mortos e mais de que nós mesmos vamos estar ali um dia, fazemos túmulos planos, esteticamente modernos e que mais parecem lajotas em um calçadão do que jazigos grandiosos, vá lá, opulência pura para deixar claro que nem a morte pode quebrar a diferença de classes mas, deixamos tudo com um grau de asceticismo que beira o esquecimento.


Nossa memória dos mortos vai, no máximo, até o sétimo dia e o que antes era prática comum, hoje se limita a uma pequena parte do jornal onde se pode ler as odes ao que se foram, costume antigo e, creio que, ainda perpetuado por um pequeno numero de pessoas ainda apegadas às tradições mais clássicas, desconsidero o que se faz como homenagem póstuma em redes sociais, acho macabro pois fica lá é pra sempre, como se o morto pudesse curtir ou comentar de um facebook do além, cruz credo! Ao menos no jornal é naquele dia e pronto, acabou!


Antes, velava-se os defuntos em casa pois eram familiares e lugar deles é em casa, onde todos se reuniam para prestar as ultima homenagens ao falecido e acabava mesmo com ares de festa mortuária o que entendo ser legal pois antes comemorar o que houve de bom com aquele que se foi do que lamentar sua agora eterna ausência fazendo da vida dos que ficam um inferno oco e sem gosto. Claro, fácil falar, fazer é que são elas mas, enfim, apressamos tudo na vida sem saber que isso só nos põe mais próximo das mãos da morte e acabamos assim apressando ela em seu rituais para que passe logo e possamos colocar terra sobre ela, abafando os sentimentos apenas para cobri-los depois com camadas e mais camadas de antidepressivos.


Lidar com a morte, clichê, faz parte da vida, seu moço! Esse ritual todo, ainda que doloroso pois nos arrancou alguém que gostávamos, precisa ter seu tempo respeitado e processado de acordo, sem pressa, sem velocidade para que acabe logo, fuga dos momentos ruins como se vida fosse feita apenas de momentos doces. Do jeito que a coisa vai, acabaremos tendo é a morte sem os mortos.


Não quero morrer que não sou tatu mas, quando vier a hora, quero mais é que os que ficam façam uma festa e bebam meu corpo oco, festejam o que vivemos juntos e não o que não viveremos mais, quero sim os choros dos que me amam mas não pela minha ausência e sim pela doce lembrança de que passei por suas vidas, as marquei de alguma forma e os fiz feliz ainda que por míseros segundos.


Façam isso por mim, eu mesmo estarei é morto e disso tudo pouco vou aproveitar mesmo.


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