24 de mar. de 2011
oh, martha!
Foi minha mãe que me levou para o mundo do cinema, era apaixonada pelos filmes e pelos grades astros e estrelas da época de ouro de Hollywood ainda que, quando começou a me levar às salas de cinema, esse período já houvesse há muito findado.
Porém, nessa mesma época, a Sessão da Tarde era um baú de tesouros não a pasmaceira que é hoje e clássicos como 'Quo Vadis', 'Scaramouche', 'Moby Dick' entre outros eram constantes e, juntamente com tantos outros formaram meu gosto pelos grandes clássicos (filmes e atores/atrizes) aliado, claro, ao fato de eu ser gay, oras!
O preimeiro filme com Liz que assisti foi, se não me engano, 'Assim caminha a humanidade', sua beleza era única e, penso eu, acabou ofuscando junto com sua vida atribulada, seu talento que era sim, imenso. Acho que sua performance mais marcante foi neste filme aqui:
Um drama pesado, carregado e com interpretações foda de Taylor (ganhou um Oscar por sua atuação) e Burton. Reza a lenda que o clima tenso entre George e Martha nem precisou de ensaio pois os dois usaram sua relação complicadíssima (tiveram várias idas e vindas mas Taylor confessou, quando Burton morreu, que ele foi seu único e grande amor) como base para as rusgas de casal do filme.
Poucos filmes, em minha opinião, fizeram um tratado tão profundo sobre relacionamentos falidos, frustrações, mágoas, raiva, medo e ainda assim, amor no meio de tudo isso. Um dos melhores filmes que já assisti.
Agora ela se foi e, infelizmente, não há outra que possa preencher essa vaga. Não quero ser o chato saudosista mas, porque me parece que nessa época as coisas tinham mais graça e glamour?
18 de mar. de 2011
casos de polícia
Ficar em casa tem suas desvantagens, poucas mas elas existem. Uma delas é estar a mercê do que passa na TV seja aberta ou paga, ilusão pura achar que a segunda vai livrar você do marasmo pois mesmo ela tem seus dias de 'não passa nada que preste nesta merda'.
Ainda assim, é melhor do que a TV aberta, terreno fértil de programas destinados ao sensacionalismo, donas de casa frustradas e entediadas e descocupados como eu. Existe também sempre a possibilidade de ligar o DVD e assistir a um filme o que faço sempre que a aberta e a paga parecem competir na programação desinteressante.
Mas, confesso que às vezes a atração pelo bizarro fala mais alto e isso aconteceu ontem quando resolvi assistir ao 'Casos de Família' no SBT, o tema do programa era 'Será que ele é gay?'. Vamos por partes.
1. Trata-se do SBT, emissora notoria por nao ter lá assim uma programação de primeira e que anda mal das pernas porque seu dono há muito devia ter entrado no baú e ter sido posto a sete palmos
2. Dentro da 'proposta' da emissora, o programa em questão está ótimo pois se propõe a tratar desavenças familiares ou afins o que realmente faz mas num clima de feira livre quase tele-catch
3. A apresentadora Cristina Rocha parece estar na varanda conversando com a vizinha e, diferente de Regina Volpato, sua antecessora, não trata as pessoas como adultas e procura mesmo entender o problema, buscar uma possível solução além de atuar como mediadora. Cristina, provavelmente instruida pelo dono da casa, quer e faz o circo pegar fogo fazendo a alegria da 'palhaçada' geral
Enfim, isso apenas para localizar o leitor. Como o tema ontem era 'da classe', fui eu lá ver o que sairia desse chapéu de mágico de segunda. Engraçado como as emissoras realmente se segmentaram de acordo com as classes sociais pois os gays que estavam no SBT não são os mesmos gays que se poderia ver na Globo, Record ou Bandeirantes.
Lá, a impressão era de que tinham pego os viados na porta da emissora ou, sem preconceitos, no Largo 13 ou da Concórdia (tinha uns cafuçus que me deixaram fazendo a Shakira = 'loca, loca, loca'). Na verdade, penso mesmo se não pagaram para um pessoal na rua ir no programa e passar aquele vexatório todo o que não me surpreenderia se for verdade, acho que os unicos gays legitimos eram um casal participante do programa, um outro cara que só de abrir a boca já entregou o jogo e as da platéia.
E começou o show de horrores. O lance era adivinhar, dentre os dez caras no palco, quem eram os gays e quem eram os heteros sabendo-se que a proporção era de 50% cada. Cristina brincava com a platéia, perguntando como saber quem é gay e quem não é e daí desfilou-se na tela um sem fim de absurdos. Não satisfeita, ela fazia questão de tirar a prova de cada 'dica' de como pegar um viado com cada um dos moços do palco. Para coroar tudo, havia um semáforo onde os gays deveriam, ao fim do programa apertar a luz verde para indicar que eram gays, os heteros deveriam apertar a luz vermelha e havia um amarelo que servia talvez para o 'bis' ou aqueles que ainda não resolveram (claro que esse não usado). Teria sido a associação de cores relacionada a gay = dá o cu = libera = verde / hetero = não dá o cu = não libera = vermelho?
No final, os heteros não precisavam fazer nada mas o gays precisavam abrir um imenso armário que estava no palco, sacar de lá uma capa dourada e uma tiara e usá-los, preciso explicar? Acho que não. Longe de mim me tornar um politicamente correto, um chato de plantão; quero que ainda se possa fazer piada de viado e que possamos rir dos outros e de nós mesmos sempre. Sem isso, já disse aqui outras vezes, não há porque lutar por direitos pois acima dos direitos civis existe, penso eu, direitos como liberdade de expressão e não quero meus direitos sob os escombros dos de outros. Como disseram por aí, não concordo com o que você disse mas vou defender com unhas e dentes seu direito de dizê-lo.
Porém, esse tipo de programa é um total desserviço e ainda que seus espectadores se divirtam não se tenha desrespeitado ninguém (a coisa estava mais para farsa caricata do que humor ácido), fica para mim uma sensação de às minhas custas pois não se adicionou nada ao assunto, não se mostrou esse ou aquele ponto de vista era apenas um grande circo, nada mais. Porque os que participaram do programa aceitaram faze-lo? Muitos deles se outorgaram como profissão modelo (mais para michê ou go go, devo dizer) e então a exposição sobrepõe o mico?
Não quero que esse tipo de programa seja banido pelas razões que expus acima mas seria interessante que para cada um desses se fizesse outro onde temas gays são realmente discutidos com seriedade (utopia). Isso porémm, implicaria inserir nos humorísticos quadros que mostrassem situações cômicas com gays fora do estereótipo que esse tipo de programa está habituado a exibir e isso, não traria muita audiência não é mesmo?
16 de mar. de 2011
14 de mar. de 2011
3 de mar. de 2011
eu te amo você
Quando eu era jovem, recém saído do armário e certo de que ficar com homens era meu destino, tecia para mim um sonho de achar o alguém perfeito. Acho que todos nós fazemos isso independente de sermos homo ou hetero ou bi ou seja lá qual for a nova moda sexual.
Algo genético nos impele a procurar outra pessoa pois nós mesmos, apesar de completos, não parecemos ser inteiros e passamos a buscar essa parte faltante nos outros primeiro talvez com apetita sexual acentuado mas depois, com o passar do tempo, há que se ter isso associado a outras caractrerísticas como caráter, personalidade, compatibilidade, respeito, admiriação e tudo mais que junto forma essa coisa chamada amor.
Quando mais novos, o amor não tem bem uma forma definida e pode ser qualquer coisa que nos agrade, lembro de ter amado demais todos os caras com quem engatei um relacionamento mais duradouro, como se eles fossem as pessoas com quem passaria o resto da vida mesmo porque, naquela época, eles assim pareciam para mim.
Mas, você fica mais velho, o tempo ensina na marra se você não quer aprender e então você entende que esses caras que passaram foram amores sim, fortes, intensos, paixões ensandecidas e mesmo alguns deles poderiam até ter se tornado aquela pessoa que você consegue enxergar lá na frente, no futuro, ao seu lado, sem névoas envolvendo o amanhã, sem dúvidas, sem receios, sem incertezas a não ser as que são compartilhadas pelos dois.
Pode ser que tudo isso isto soe folhetinesco, novelesco, clichê e datado mas, o amor tem roupa nova? Pode até vestir-se de muitos brilhos e doirados, rococó mas, no final, está com um vestido simples e básico que serve perfeitamente a seu propósito. Nós, por outro lado, adoramos torcer o nariz para roupa tão barata e lhe cobrimos de regalos, apetrechos, adereços, complementos, ornamentos, alegorias até que o amor mesmo não se reconhece mais e daí pomos a culpa um no outro e matamos o amor que sob camadas de tranqueiras não consegue se fazer ouvir e morre sufocado e esquecido.
A tarefa não é simples, é traiçoeira, ingrata e demanda tempo e atenção mas eu há nove anos me dedico a ela com louvor e ardor. Há nove anos eu me dedico a ele, Wans, e não quero outro amor que não seja o dele, não vejo outro amor que não seja o dele pois quando eu preciso, precisei, ele estava lá, ele está lá.
Quando eu for velho e não puder mais controlar as funções do meu corpo com a mesma tenacidade, é nele que vou buscar força e apoio, é ele que eu quero ver do meu lado quando a pele enrugar, a fala engasgar, os olhos verem pouco e os ouvidos truncarem as frases mesmo porque, com ele, nada disso será preciso pois sei o que ele me diz sem precisar das palavras e aos meus olhos ele mesmo envergado sob o peso dos anos ainda será aquele menino que eu conheci.
Não quero por minha vida nas mãos de outros, só nas dele. Quando eu estiver no leito final, na hora ruim, não aceito outra pessoa ao meu lado que não seja ele, segurando minha mão, apoiando minha cabeça e me preparando para fazer essa passagem tão complicada e indesejada. Com isso não me importarei de ir, seja lá para onde for e quando lá chegar vou ficar te esperando pois sei que o amor que temos não vai acabar quando a carne esmorecer e se esvair, ele é de outras dimensões e talvez nelas consigamos entender bem o que é isso que nos une pois ainda acho fraco usar apenas eu te amo para identificar o que sinto por você.
Algo genético nos impele a procurar outra pessoa pois nós mesmos, apesar de completos, não parecemos ser inteiros e passamos a buscar essa parte faltante nos outros primeiro talvez com apetita sexual acentuado mas depois, com o passar do tempo, há que se ter isso associado a outras caractrerísticas como caráter, personalidade, compatibilidade, respeito, admiriação e tudo mais que junto forma essa coisa chamada amor.
Quando mais novos, o amor não tem bem uma forma definida e pode ser qualquer coisa que nos agrade, lembro de ter amado demais todos os caras com quem engatei um relacionamento mais duradouro, como se eles fossem as pessoas com quem passaria o resto da vida mesmo porque, naquela época, eles assim pareciam para mim.
Mas, você fica mais velho, o tempo ensina na marra se você não quer aprender e então você entende que esses caras que passaram foram amores sim, fortes, intensos, paixões ensandecidas e mesmo alguns deles poderiam até ter se tornado aquela pessoa que você consegue enxergar lá na frente, no futuro, ao seu lado, sem névoas envolvendo o amanhã, sem dúvidas, sem receios, sem incertezas a não ser as que são compartilhadas pelos dois.
Pode ser que tudo isso isto soe folhetinesco, novelesco, clichê e datado mas, o amor tem roupa nova? Pode até vestir-se de muitos brilhos e doirados, rococó mas, no final, está com um vestido simples e básico que serve perfeitamente a seu propósito. Nós, por outro lado, adoramos torcer o nariz para roupa tão barata e lhe cobrimos de regalos, apetrechos, adereços, complementos, ornamentos, alegorias até que o amor mesmo não se reconhece mais e daí pomos a culpa um no outro e matamos o amor que sob camadas de tranqueiras não consegue se fazer ouvir e morre sufocado e esquecido.
A tarefa não é simples, é traiçoeira, ingrata e demanda tempo e atenção mas eu há nove anos me dedico a ela com louvor e ardor. Há nove anos eu me dedico a ele, Wans, e não quero outro amor que não seja o dele, não vejo outro amor que não seja o dele pois quando eu preciso, precisei, ele estava lá, ele está lá.
Quando eu for velho e não puder mais controlar as funções do meu corpo com a mesma tenacidade, é nele que vou buscar força e apoio, é ele que eu quero ver do meu lado quando a pele enrugar, a fala engasgar, os olhos verem pouco e os ouvidos truncarem as frases mesmo porque, com ele, nada disso será preciso pois sei o que ele me diz sem precisar das palavras e aos meus olhos ele mesmo envergado sob o peso dos anos ainda será aquele menino que eu conheci.
Não quero por minha vida nas mãos de outros, só nas dele. Quando eu estiver no leito final, na hora ruim, não aceito outra pessoa ao meu lado que não seja ele, segurando minha mão, apoiando minha cabeça e me preparando para fazer essa passagem tão complicada e indesejada. Com isso não me importarei de ir, seja lá para onde for e quando lá chegar vou ficar te esperando pois sei que o amor que temos não vai acabar quando a carne esmorecer e se esvair, ele é de outras dimensões e talvez nelas consigamos entender bem o que é isso que nos une pois ainda acho fraco usar apenas eu te amo para identificar o que sinto por você.
sol quadrado
Não tenhoa atração por garotos. Gosto de macho, rústico, homem mesmo.
Mas, Tom Daley, me faz pensar o oposto:
Se com 16 anos está assim, que dirá com mais de 20 ou 25? Quem aos 16 anos tem esse corpo (a invejosa)? As rachinhas e os meninos devem ficar loucos.
Tom, quando você for maior de idade, me procure ok? Precico muito falar com você um salto em profundidade...
Mas, Tom Daley, me faz pensar o oposto:
Se com 16 anos está assim, que dirá com mais de 20 ou 25? Quem aos 16 anos tem esse corpo (a invejosa)? As rachinhas e os meninos devem ficar loucos.
Tom, quando você for maior de idade, me procure ok? Precico muito falar com você um salto em profundidade...
contralto
Eu gosto de mpb. Desde os instantâneos de realidade de Chico até as maconhices de Djavan, do intelectualismo egocêntrico de Caetano ao non-sense de Gil, da boemia suja e barata de Nelson Gonçalves à classe rude de Angela Roro.
O que eu não suporto é essa onda de cantoras 'bi' de voz pesada, essa praga prolifera feito gremlins e quando você acha que já ouviu a última, alguém levanta uma pedra e sai outra. Incrível como uma é a emulação da outra, uma diagramação diferente do mesmo, será que sou eu o chato ou todo mundo não vê a mesmice de Ana Carolinas e Marias Gadus nos enfiam goela abaixo?
Qual o valor artístico delas? Fazer músicas com outros descolados tipo Seu Jorge? Fazer letras mela calcinha? Ser bissexual (e isso está na moda) e sair-se bem dizendo que gosta de pessoas? Que o que interessa é a música e não com quem ela vai para a cama? Se houvesse mesmo música ninguém ia querer saber de suas vidas sexuais e, desculpe, mas sua negação em ao menos apoiar a bandeira, não precisa ser aríete, é rídicula pois no gargarejo garanto que a grande maioria é de rachas ensandecidas prontas para abrir as pernas às novas deusas da canção.
Ao menos Cássia tinha atitude e Zélia tinha postura e se me ressinto delas é pelos simples fatoi de terem aberto esse filão maldito na mpb. Numa terra onde Gal e Bethânia são consideradas elitizadas, Marisa se encastela num patamar de monstro sagrado adulada pelo seu próprio séquito e há uma Vanessa com voz infantil e vulgo articulada, sem Maysas, sem Elis, reinam essas coisas que assexuadas, voz rouca e violão de segunda fazem você acreditar que mpb é isso que está aí mesmo.
2 de mar. de 2011
PUT(a) polaróides urbanas em texto
Semana passada, Quinta, fui à tarde na Biblioteca São Paulo que fica ali no Carandiru onde antes era o presídio. Uma evolução termos trocado as grades pelos livros mas nem tanto quando algumas pessoas que lá vão confundem o lugar com boteco ou sala de casa e começam a conversar em voz alta.
Porque vamos a uma biblioteca? Para ler, pesquisar, trabalhar até e, no meu caso, para escrever em paz, em silêncio e mudar um pouco de ares para que as idéias fluam ou se reiventem ante lugares novos. Porém, tem gente que, como disse, acha que ali é uma extensão de seu lar ou 'happy hour' com amigos e com frequência preciso recorrer aos fones de ouvido para me isolar do ruído externo com ruído interno e daí foi-se para a casa do caralho o silêncio pois é bom sim às vezes não ouvir nada além de seus pensamentos.
Me impressiona como temos pouca ou nenhuma consideração pelo alheio, pelo próximo, somos extremamente individualistas e se você reclama passa por grosso, rude ou recalcado. Você está errado quando certo e, assim, está certo quando, como os demais, está errado mas agindo de acordo com a regra social vigente de cada um por si e todos contra todos pois Deus saiu da equação faz é tempo pois cansou de apontar o 'x' da questão.
Enfim, estava chegando ao ponto de clímax de um capitulo quando sou interpelado por um cafuçu (catável, não sou boba).
Ele: 'Posso usar essa tomada aqui?' e aponta para o chão onde havia uma tomada vazia ao lado da que era ocupada por meu netbook.
Eu: 'Claro, pode usar' disse medindo o cafuçu de cima abaixo. Essa biblioteca é pródiga na frequênica de cafuçus, vai por mim, se quer pegar um vai lá, impressiona ele com sua cultura e leva para casa para o lanche da tarde.
Voltando, ele espeta o carregador na tomada, deixa o aparelho ali carregando e sai mas, em seu lugar, fica um amigo que acabara de chegar, vejo que eles conversam algo mas não sei o que pois não retirei os fones de ouvido. Então o cafuçu recém chegado senta-se ao meu lado e me pergunta algo, sou forçado a retirar os fones de ouvido.
Cafuçu: 'É um notebook?' sai a pergunta com sotaque carregadíssimo que não deixa dúvidas de onde ele veio. Já fico úmida.
Eu: 'Não, é um netbook' e olho para ele. Moreno, deve ter seus vinte anos, braços grossos, cabelo preto, sorriso que derreteria a calota polar, coxas boas dentro do jeans, mãos fortes, garoto feito homem na vida dura.
Cafuçu: 'Mas qual diferença?'
Eu: 'Bom, este é menor, menos potente, mais para acessar a net mesmo e escrever sabe?'
Cafuçu: 'Ah, entendi...eu vim aqui retirar esse livro' e me mostra isto aqui:
Fico olhando para o livro, longe de mim ter preconceito, ainda mais viado que sou mas, olhei para o livro e olhei para ele e fiquei com aquela sensação de que algo ali não casava. Como poderia ser culto em pele de orgro, resolvi descobrir até onde ia seu conhecimento do assunto.
'Legal esse livro, posso ver?' perguntei.
'Claro' disse ele e me estendeu o livro 'a moça daqui disse que esse livro custa R$300!! Disse que eu posso levar mas se acontecer alguma coisa eu tenho de pagar!'
'É' disse eu 'capa dura, papel bom ' e lhe estendi o livro de volta 'ilustrações, é caro mesmo mas não acho que chegue a tanto. Qual editora?'
Ele ficou olhando para o livro, sem saber o que responder. Olhava para mim como a perguntar o que era editora. Peguei o livro de volta e achei o nome Cosac Naif.
'É' disse eu 'os livros dessa editora são caros mesmo...e esse livro é de história, técnico, deve ser caro'
'Por isso que eu peguei' disse ele 'é de 'histórias' e tem umas figuras bonitas...'
Pronto. Comprovada minha suspeita de que livro e cafuçu não se dariam bem, voltei ao processo de umidificação. Depois disso ele me perguntou sobre as tatuagens, se tinha doído, onde eu fizera. Depois falou de SP, das chuvas e de como o tempo mudava aqui rápido, de como as pessoas eram frias, de como a cidade era enorme, eu querendo lhe servir de guia, ia mostrar uma cidade que ele não ia esquecer tão cedo.
Descobri que ele é do Maranhão e que, antes de SP, passou por Imperatriz, Fortaleza, Goiania e Brasilia de onde uma tia lhe deu grana para tentar a vida por aqui. Ele chegara fazia pouco mais de um mês, estava num tipo de albergue com amigos e como não se atrevia a sair pela cidade com medo de não saber mais voltar para o albergue, ia apenas na biblioteca que era próxima do referido lugar.
Ele ia falando e eu ia imaginando ele pelado, dava para ver pelos no peito pela gola da camiseta e eu dei mais corda. Ele disse que já tinha passado fome aqui (se tivesse me conhecido antes não ia passar não) e que única distração dele era vir ali e pegar livros para ler. OK gato mas na próxima pega um mais fácil pois seu currículo, você mesmo disse foi de no máximo 'Crepúsculo' e que você levou mais de um mês para ler.
De repente, o amigo o chama e ele se vai. Vejo-o de novo alguns minutos depois com outro amigo, cafuçu também e simplesmente delicioso, um ar de malandro que me faria cozinhar para ele e lavar sua cuecas com freada. Eles conversam entre as estantes com livros.
Malandro: 'Mano, pega um livro aí pra fulano!'
Cafuçu: 'Mas qual?'
Malandro: 'Ah, sei lá mas tem de ter figura mano, tem de vir com figura sacou?'
Continuo escrevendo e, no fim do dia, vou embora. Quando estou descendo as escadas, em direção à saída, ele me vê lá de cima e acena, aceno de volta com um sorriso, nem sei o nome do cafulçu. Quando eu voltar na biblioteca e, por sorte, ele estiver lá, com uns dez contos e um lanche ele pode ser meu, duvida?
Porque vamos a uma biblioteca? Para ler, pesquisar, trabalhar até e, no meu caso, para escrever em paz, em silêncio e mudar um pouco de ares para que as idéias fluam ou se reiventem ante lugares novos. Porém, tem gente que, como disse, acha que ali é uma extensão de seu lar ou 'happy hour' com amigos e com frequência preciso recorrer aos fones de ouvido para me isolar do ruído externo com ruído interno e daí foi-se para a casa do caralho o silêncio pois é bom sim às vezes não ouvir nada além de seus pensamentos.
Me impressiona como temos pouca ou nenhuma consideração pelo alheio, pelo próximo, somos extremamente individualistas e se você reclama passa por grosso, rude ou recalcado. Você está errado quando certo e, assim, está certo quando, como os demais, está errado mas agindo de acordo com a regra social vigente de cada um por si e todos contra todos pois Deus saiu da equação faz é tempo pois cansou de apontar o 'x' da questão.
Enfim, estava chegando ao ponto de clímax de um capitulo quando sou interpelado por um cafuçu (catável, não sou boba).
Ele: 'Posso usar essa tomada aqui?' e aponta para o chão onde havia uma tomada vazia ao lado da que era ocupada por meu netbook.
Eu: 'Claro, pode usar' disse medindo o cafuçu de cima abaixo. Essa biblioteca é pródiga na frequênica de cafuçus, vai por mim, se quer pegar um vai lá, impressiona ele com sua cultura e leva para casa para o lanche da tarde.
Voltando, ele espeta o carregador na tomada, deixa o aparelho ali carregando e sai mas, em seu lugar, fica um amigo que acabara de chegar, vejo que eles conversam algo mas não sei o que pois não retirei os fones de ouvido. Então o cafuçu recém chegado senta-se ao meu lado e me pergunta algo, sou forçado a retirar os fones de ouvido.
Cafuçu: 'É um notebook?' sai a pergunta com sotaque carregadíssimo que não deixa dúvidas de onde ele veio. Já fico úmida.
Eu: 'Não, é um netbook' e olho para ele. Moreno, deve ter seus vinte anos, braços grossos, cabelo preto, sorriso que derreteria a calota polar, coxas boas dentro do jeans, mãos fortes, garoto feito homem na vida dura.
Cafuçu: 'Mas qual diferença?'
Eu: 'Bom, este é menor, menos potente, mais para acessar a net mesmo e escrever sabe?'
Cafuçu: 'Ah, entendi...eu vim aqui retirar esse livro' e me mostra isto aqui:
Fico olhando para o livro, longe de mim ter preconceito, ainda mais viado que sou mas, olhei para o livro e olhei para ele e fiquei com aquela sensação de que algo ali não casava. Como poderia ser culto em pele de orgro, resolvi descobrir até onde ia seu conhecimento do assunto.
'Legal esse livro, posso ver?' perguntei.
'Claro' disse ele e me estendeu o livro 'a moça daqui disse que esse livro custa R$300!! Disse que eu posso levar mas se acontecer alguma coisa eu tenho de pagar!'
'É' disse eu 'capa dura, papel bom ' e lhe estendi o livro de volta 'ilustrações, é caro mesmo mas não acho que chegue a tanto. Qual editora?'
Ele ficou olhando para o livro, sem saber o que responder. Olhava para mim como a perguntar o que era editora. Peguei o livro de volta e achei o nome Cosac Naif.
'É' disse eu 'os livros dessa editora são caros mesmo...e esse livro é de história, técnico, deve ser caro'
'Por isso que eu peguei' disse ele 'é de 'histórias' e tem umas figuras bonitas...'
Pronto. Comprovada minha suspeita de que livro e cafuçu não se dariam bem, voltei ao processo de umidificação. Depois disso ele me perguntou sobre as tatuagens, se tinha doído, onde eu fizera. Depois falou de SP, das chuvas e de como o tempo mudava aqui rápido, de como as pessoas eram frias, de como a cidade era enorme, eu querendo lhe servir de guia, ia mostrar uma cidade que ele não ia esquecer tão cedo.
Descobri que ele é do Maranhão e que, antes de SP, passou por Imperatriz, Fortaleza, Goiania e Brasilia de onde uma tia lhe deu grana para tentar a vida por aqui. Ele chegara fazia pouco mais de um mês, estava num tipo de albergue com amigos e como não se atrevia a sair pela cidade com medo de não saber mais voltar para o albergue, ia apenas na biblioteca que era próxima do referido lugar.
Ele ia falando e eu ia imaginando ele pelado, dava para ver pelos no peito pela gola da camiseta e eu dei mais corda. Ele disse que já tinha passado fome aqui (se tivesse me conhecido antes não ia passar não) e que única distração dele era vir ali e pegar livros para ler. OK gato mas na próxima pega um mais fácil pois seu currículo, você mesmo disse foi de no máximo 'Crepúsculo' e que você levou mais de um mês para ler.
De repente, o amigo o chama e ele se vai. Vejo-o de novo alguns minutos depois com outro amigo, cafuçu também e simplesmente delicioso, um ar de malandro que me faria cozinhar para ele e lavar sua cuecas com freada. Eles conversam entre as estantes com livros.
Malandro: 'Mano, pega um livro aí pra fulano!'
Cafuçu: 'Mas qual?'
Malandro: 'Ah, sei lá mas tem de ter figura mano, tem de vir com figura sacou?'
Continuo escrevendo e, no fim do dia, vou embora. Quando estou descendo as escadas, em direção à saída, ele me vê lá de cima e acena, aceno de volta com um sorriso, nem sei o nome do cafulçu. Quando eu voltar na biblioteca e, por sorte, ele estiver lá, com uns dez contos e um lanche ele pode ser meu, duvida?
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